30.1.09

Estado de Ditadura do Direito

Till Koenneker

Adorei esta expressão dita no blog Nhu Naxu (Estado de Ditadura do Direito), a propósito um blog de muita qualidade, com um discurso sério, engajado, colectivo, que para mim é um aspecto muito gratificante


O que me parece que esteja errado com o nosso Direito é que não estará alinhado com os nossos ideias humanos, sociais, ambientais, filosóficos, etc. Estamos constatando isso agora, que aberrações aparecem no plano da Justiça. É certo que da Indepedência para cá o que era preciso era fazer e fazer mais leis, copiando, adaptando, modificando à medida das circunstâncias, porque a Lei é o que nos mantêm civilizados. Mas, complexificando-se a sociedade, há que fazer 2 coisas: 1 - discutir muito as bases que sustentam as leis; 2 - promover uma ampla participação social no processo de construção das leis. Há áreas que desempenham melhor que outras. Lembro-me da Lei do Trabalho que teve uma participação razoável, não suficiente. Mas quem sabe, por exemplo, de Leis do Ambiente, a não ser um punhado de gente? Pois cidadãos, se queremos participar deste Estado de Direito, elementar, temos que conhecer o nosso próprio Direito.

E o jogo político não é inocente nesta lacuna de precisão da lei e da vigilância da sociedade. Lá onde há uma brecha legal, encaixam um projecto, como é o caso da Murdeira, manifestamente. Vou conhecendo o dossier aos poucos. O que já sei (ou penso que sei) é que afinal o sítio é classificado como reserva natural INTEGRAL. Fiquei a saber também que o Estudo de Impacte Ambiental (EIA) do projecto da marina é MUITO IMPRECISO. Haverá alguma brecha legal que permita a que o Governo torne a avançar, senão não teria avançado. O que pergunto é: porquê forçar um projecto, no limite da lei? Ou seja, mesmo que a lei permita o projecto, haverá aqui um primado do negócio (e não económico, já que não está demonstrado o benefício económico para a população) sobre o primado da cautela ambiental (sobretudo) e social (derivado).

Está na lei? E a lei serve? E a lei, beneficia o quê e quem? Já temos provas que muitas leis prejudicam-nos gravemente: a lei das privatizações, a lei da terra, etc. Está provado que estamos avançando vorazmente para negócios, sem cautela: no meu sector, Telecomunicações, hei de vos enumerar as grandes burrices que fizemos ao privatizar a CVTelecom.

Estado de Ditadura do Direito é isso afinal: está na lei, faz-se. Mas e que lei é esta?

(Os estudos estão aqui. Bastante elucidativo)

29.1.09

Estado excepção (um depoimento excepcional)

Kiko, como o chamamos, mas formalmente Carlos Ferreira Santos, Eng.Naval, envolvido no caso Murdeira, deixou aqui um grande depoimento, que por ser tão grande foi "promovido" a post (Kiko, ficamos saldados na questão das cervejas, eheheheh). Então aqui vai, ipsis verbis:

"Meu Caro César, vamos comunicando...

O principal problema aqui é que cada um tem um conhecimento isolado do caso, isso gera então a confusão. O Colega do Ambiente só tem conhecimento dos aspectos ambientais. O Colega da Economia tem conhecimento dos aspectos económicos. O Colega das Infra-Estruturas tem o conhecimento técnico do dossier de construção etc, etc.. no fim o Ministro junta todos os pareceres, incluindo o parecer jurídico e toma uma decisão, apoiado pelo Conselho de Ministros.

Entendo a indignação do Colega do Ambiente… mas Cabo Verde não é só ambiente. E o colega perde toda a razão quando os técnicos das infra-estruturas apresentam um conjunto de medidas que elimina ou reduz a alguma insignificância qualquer impacto que se possa ter no ambiente e que já não está a ser causado agora mesmo.

Podíamos rapidamente entrar com alguns aspectos e aproveito para tranquilizar o César para os principais pontos que ele focou:

1 – "Alguém tem que convencer o César que os técnicos do ambiente não foram ultrapassados".

Não foram ultrapassados, as suas razões e justificações não foram suficientemente fortes para anular o projecto, só isso. (lembremos dos outros pontos que já considerei…)

2 - "Murdeira não pode ser mexida, pelo simples facto de ser RESERVA AMBIENTAL PROTEGIDA, que só pode ser usada para fins educativos ou científicos, mesmo assim o Governo decide avançar com o projecto".

Nada mais falso e aqui começa a grande confusão meu caro César.

Para já não existe o termo técnico Reserva ambiental protegida. Existem sim várias classificações para Reservas naturais. E no Caso de Murdeira é uma RESERVA NATURAL PARCIAL MARINHA (Decreto Lei nr. 3/2003 de 24 Fevereiro).
Se calhar o "parcial" estraga a festa dos ambientalistas, mas a classificação é feita conforme o parecer deles. Quisessem e tivessem conseguido justificar uma Reserva Natural Integral, ali sim o debate estaria encerado. No entanto Murdeira não é uma Reserva Natural Integral e é pura fantasia que não pode ser mexida. Ou seja os próprios ambientalistas não reconheceram a necessidade de ser a Murdeira uma Reserva Natural Integral. ( e já não pode, até porque ali existem já diversas construções e haverão mais na orla).
Assim na reserva natural parcial marinha é possível “aproveitamento racional da zona em questão, sem por em causa a capacidade de renovação e estabilidade ecológica da mesma”.
E é precisamente o que se pretende fazer…. e o Dr. Moeda que entende mais de lei, mais de ambiente, mais de marinas que todos os Ministérios e técnicos juntos, não quer…. Grande Estado de Direito o nosso.

Mais ainda, a Murdeira é uma ZDTI (Decreto-Regulamentar nr. 12/2005 que declara as orlas Marítimas de Algodoeiro e Murdeira de ZDTIs “para nelas se implantarem infra-estruturas turísticas e ou hoteleiras, v. G. Marina Ocêanica, unidades hoteleiras e similares de qualidade…”. ).

A questão legal é puramente esta, mas… esquecemos que há o Dr. Moeda que entende mais de…. e de …… etc.

3 – Explosivos na baia????

Só se for para explodir a cabeça de alguém…. César, és candidato?

Primeiro e o que ninguém disse: a marina não será construída na baia da Murdeira mas sim em terra. É uma marina em terra minha gente (sim existe sim...). Os impactos dessa construção são iguais ao impacto de uma construção qualquer na orla (quer dizer um pouquinho mais). Não há explosivos na baia.
No entanto haverá um canal de navegação restrito e só esse pode ser usado (como uma estrada no mar… ena pá que giro). Abrir esse canal, SEM explosivos causara um impacto temporário, mas considerável na baia. Aqui ninguém consegue fugir.

Mas porque é que a marina é feita longe da Baia (fora na zona reserva marinha parcial, mas sim na zona tampão) e em terra e porque é que não se usa explosivos? Porque ao contrário do que o César diz, essa Ministrada ouve sim as opiniões dos técnicos. Neste caso pelo menos a minha opinião foi sempre ouvida…SEMPRE.

4 – “Parece que há leis que impedem literalmente que se construa estruturas na Murdeira, que não as científico-educacionais; parece que o Governo quer dar uma sobrevoada nessa nessas leis”:

Não, já vimos que não… não se pretende sobrevoar nada, aliás a Lei nem sequer diz isso… Big Fantasy.

5 – “Parece que os técnicos são ultrapassados”:

Não, já vimos que não.. ninguém é ultrapassado, são todos ouvidos, mas o que não podemos querer é que a nossa opinião seja aquela a ser adoptada. Há mais opiniões que devem ser levadas em contas. Neste caso eu confiro: a minha opinião e de muitos outros foi levado em conta e, talvez por termos justificado melhor a nossa posição técnica ela vigorou. Aliás, alguém já ouvir falar em “clean ou green Marina”. Pois deviam…. Os impactos são tão reduzidos que justifica sim… principalmente se adicionados os impactos sócio-economicos.

6 – “Parece que a sociedade tem medo de pôr a boca no trombone”

Eu não tenho.. o César não tem. O John Branco também não? A Familia Andrade de Monte Sossego…. e nós somos o quê? Society?

7 – “Parece que um magistrado resolveu por ordem nisso tudo. É tudo um reino de "parece"….

Parece mesmo …. E aqui começa o Estado de Direito Democrático (com regime politico parlamentarista) a degradar-se… completamente até.

Felizmente entende o Sr. Magistrado mais do assunto do que todos nós… que os Ministros, que os assessores, que técnicos, que as Direcções Gerais… que tudo. Aliás, os Magistrados são umas gandas Chico-Espertos. Só não entendem mesmo é de justiça… ou não teríamos assassinos confessos a vadiar entre nós. Que irónico esta minha sociedade.

Só dou razão ao César na ultima parte… precisamos de facto comunicar… muito até.

E para chatear, aqui vai ainda um monte de recomendações para mexer com a cabeça de que não esteve por dentro do dossier e acha super engraçado insurgir-se contra o Estado, quando o seu representante executivo, o coitado do Governo, mais não faz do que cumprir a lei:

Arranjem tempo e deliciem-se:

recomendações a seguir:

a) Deve-se referir que o projecto apresenta-se num ambiente legislativo extremamente favorável, onde o próprio Governo promove a implementação do projecto através da criação da ZDTI de Murdeira e do Plano Director das Infra-estruturas de apoio a Náutica de Recreio, onde ambos prevêem a construção de uma Marina na Baia da Murdeira como forma de trazer qualidade aos empreendimentos turísticos na ZDTI de Murdeira. De facto, a náutica de recreio é um segmento do turismo de luxo, que juntamente ao turismo do golfe, maiores receitas produz, indo de encontro a estratégia do Governo, de promover turismo de segunda residência e de alta qualidade, fugindo ao turismo do “all inclusive” e curtas estadias. Assim o projecto de marina enquadrado no complexo turístico da Murdeira enquadra-se completamente nesta estratégia.

b) Necessário será de referir que uma vez apostado no Turismo, Cabo Verde e com isso a Baia de Murdeira deverá concorrer com vários outros destinos turísticos e é considerável para a oferta turística se um complexo apresenta ou não a possibilidade de náutica de recreio. Dai a necessidade de considerar este facto como um impacto a se ter em conta.

c) O EIA apresenta duas classes de impactos, aqueles que acontecem na fase de construção do projecto e aqueles que acontecem durante a sua exploração e manutenção.

d) Relativamente a esta primeira fase, construção, o maior impacto que se prevê serão as obras de dragagem para abertura do canal de entrada para a Marina. Esta dragagem é nociva ao ambiente marinha, podendo causar poluição e contaminação bioquímica, acreditando-se no entanto que seja um impacto temporal. Os restantes impactos e por se tratar de uma o obra em terra, serão os mesmos impactos que serão causados pelas dezenas de obras de construção civil ao longo da orla da Baia, para as quais serão necessárias seguir praticas de boa gestão ambiental.

e) Em relação a fase de exploração da marina, o EIA é pouco profundo na apresentação dos impactos, limitando-se a atribui-los a possíveis acidentes e má conduta ambiental, o que não é completamente satisfatório. De facto, a exploração de marinas convencionais causa impactos consideráveis ao ambiente marinho, que se resume em pratica pela má conduta e gestão ambiental dos utilizadores. Assim a tendência mundial para o segmento da náutica de recreio é promover os “green e clean marinas”, que são estruturas de recreio que desde a sua construção e em todas as fases da sua exploração são seguidos regras severas de gestão e manutenção, causando um impacto reduzido no ambiente. Assim recomenda-se que a Marina da Murdeira seja uma “clean marina” construída com matéria que não se degradam e não necessitam de qualquer tipo de manutenção. As práticas na marina devem ser as do “eco-friendly boating” também segmento e pratica ambiental responsável para os utilizadores da náutica de recreio. Essas regras são bem definidas e devem ser adoptadas numa possível Marina na Baia da Murdeira. Estas práticas prevêem e eliminam já inúmeros tipos de acidentes ambientais, garantido a segurança ambiental da Marina. Assim nessas “clean marinas”, todos os dispositivos têm segurança dupla contra possíveis derrames de quaisquer líquidos, é proibido a limpeza, reparações e manutenção de embarcações (podendo estas serem feitas em locais próprios), e se autorizados, os líquidos utilizados são bio-degradaveis e vendidos na própria marina, promovendo também um circuito comercial etc.

f) Ainda na fase de exploração da Marina, um impacto considerável que deveria ser levado em conta no EIA seria a utilização de anti-foulings no casco de embarcações. Sabe-se hoje que anti-foulings convencionais contêm anti-vegetativos (biocidas), altamente nocivos e destrutivos ao ambiente marinho. Obvio que numa marina “Clean Marina” e em toda uma reserva natural seriam de proibir completamente os anti-foulings convencionais. Felizmente existem hoje várias alternativas para anti-foulings, que no entanto já não se baseiam na capacidade anti-vegetativa, portanto uma massa porosa com biocidas nos poros, mas sim em conceitos a base de teflon, vinyl ou silicone que cria uma superfície lisa, não oferecendo possibilidade de aderência a organismos marinhos, em vez de criar uma superfície tóxica a esses organismos. Sobre este tema, existem já convenções internacionais (IMO) que proíbem a utilização de anti-foulings a base de biocidas e cobre em embarcações de menos de 25 metros. Infelizmente na marinha comercial enormes quantidades desses anti-foulings continuam a ser utilizados, por serem mais baratos e eficazes. No segmento da náutica de recreio, existe uma grande abertura e tendência para a utilização de anti-foulings amigas do ambiente, já que trata-se de um hobby onde os custos adicionais (visto as pequenas quantidades) para aquisição de tintas, anti-foulings e detergentes bio-degradáveis ou amigas do ambiente, não é de todo considerável. Uma “Clean Marina” deve promover essas práticas e comercializar ela mesma este tipo de produto.”

g) Também na fase de exploração da Marina e focado no EIA, há a considerar os possíveis acidentes ambientais que um tráfico elevado de embarcações poderia causar, bem como a introdução de espécies invasoras (exóticas) arrastadas nos cascos de embarcações para um habitat exclusivo. Para opinar sobre estes dois aspectos, a primeira análise a fazer seria sobre o próprio grau do tráfego da Marina. Sabe-se que se trata de uma Marina Residencial Turística, quase que exclusivamente de apoio a estrutura residencial, podendo prestar algum apoio a embarcações passantes. Tratando-se de uma estrutura residencial de segunda ou terceira residência, cujos lugares (berços) são normalmente vendidos juntamente com a propriedade a adquirir (até 80% da capacidade da Marina), é facto que os utilizadores dessas segundas residências pouco tempo passam nessas instancias (algumas semanas ao ano), assim as suas embarcações são normalmente utilizadas muito poucas vezes ao ano. Desta forma, o tráfego que se refere é algo pequeno, quase insignificante, podendo ser acrescentado pelo apoio que se presta a embarcações passantes e constituindo este um factor de risco, pode perfeitamente ser eliminado, sendo que embarcações passantes terão de buscar outras facilidades em Espargos, Santa Maria ou Pedra de Lume. Sobre a introdução de novas espécies em si, com o tráfego limitado diminui-se já essa ocorrência, mas de ressalvar que a Baia de Murdeira já não é “virgem”, ela é utilizada frequentemente por embarcações e pelos próprios pescadores que afirmam ter de navegar para zonas bastante longes e até outras ilhas e retornar a Baia. Assim também este impacto não parece ser de importância elevada, nem é um facto que se ocorrerá pela primeira vez. Aos demais acidentes (principalmente derrames ou utilização de líquidos não próprios) que possam acontecer dentro da Marina, por esta se situar numa bacia artificial, oferece desde já uma bacia de retenção, onde medidas imediatas podem ser tomadas antes de se atingir a Baia em si. Assim os riscos que se corre neste tipo de Marina são bastante inferiores aos riscos de acidentes de uma Marina convencional.

h) Ao diferentes cenários de implementação apresentados no EIA, e defendo estritamente o ponto de vista ambiental, deve ser escolhido aquele que menor impacto causa ao ambiente, independentemente da solução de investimento ser mais custosa. (por exemplo a solução 2).

i) O EIA devia prever ou propor um canal de navegação limitado, único e exclusivo para se circular na Baia (com regras que definem a velocidade, frequência, horários etc), isso diminuiria vários riscos, é matéria que deve ser estudada pelas autoridades. Mais ainda, espera-se o plano de gestão da área protegida da Baia de Murdeira, que irá ditar as formas e tipos de utilização dessa Reserva Natural. Por exemplo se ficar decidido que a Reserva Natural da Baia da Murdeira pode continuar a ser utilizado por exemplo para o mergulho desportivo, ou alguns desportos náuticos, essa utilização poderá por exemplo causar um impacto ambiental negativo bastante maior do que a Marina que se prevê. É precisamente na prática de vários desportos náuticos onde a conduta pode levar a vários acidentes com repercussão ambiental. Também são as ancoragens provocadas pelas pequenas embarcações de recreio que contribuem para destruição de fundos marinhos. Para além destes, sabe-se que a utilização de pequenos motores de dois tempos (fora de borda) no pequenos deporto náutico é nociva ao ambiente, visto que até 30% do combustível e óleo acabam por misturar-se com o ar e a agua, isto derivado da própria forma de combustão desses motores. Assim, se continuar a ser autorizado o desporto náutico na Baia da Murdeira, os impactos que uma marina “clean marina” causam nesse ambiente são insignificantes se comparados aos impactos já causados por uma certa utilização dessa Baia.

j) Aos serviços que a Marina poderá prestar, estes devem ser bem estudados e autorizados ao não, caso não garantirem absoluta segurança. (Fornecimento combustível, reciclagem de fluidos, esgoto e agua, lavagem, pequena reparação etc.)
Considerando todos estes pontos e mais os reflectidos no EIA, vê-se que a construção de uma marina na zona tampão da Reserva Natural da Baia da Murdeira causa de facto impactos significativos no ambiente marinho, as mais nocivas de carácter temporal (dragegens) e as restantes, com possibilidades de serem atenuadas com boa conduta e gestão, reduzindo-as a um nível mínimo, viabilizando as possibilidades de renovação e sustentabilidade da vida natural na Baia. Também se viu que o impacto causado por este empreendimento é apenas um impacto entre muitos outros que acontecem já e irão acontecer em maior escala na Baia da Murdeira, que se não seguirem a melhor conduta ambiental, poderão inviabilizar as características únicas dessa Baia. Assim, só farão sentido estas medidas se forem de facto impostos e seguidos por todos.
Obvio que um trabalho de seguimento contínuo deve existir conforme proposto no EIA, os promotores devem ser responsabilizados pela qualidade do ambiente nessa área, devem participar activamente na co-gestão dessa área e a eles devem ser cobrados as taxas necessárias que deverão reverter ao fundo do Ambiente, responsável pelas medidas de gestão e acompanhamento de todas as áreas protegidas.

etc, etc, etc....

César tudo isso no teu Blog…. e depois dizes não ter sorte!!!! Vais pagar umas cervejas, ai se vais…. (aproveita para ligar para o Moeda e ver se ele anda a checar teu blog. ajudaria de certeza. Ou manda-lhe aquele parecer que te enviei... abre alguns horizontes)

Aquele abraço e conta sempre comigo

Kiko"

Estado de excepção - sequelas

Revista Continuum
Pelo barulho gerado pelo caso Murdeira, cá pelos lados da blogosfera, sentimos que a nossa sociedade, ou comunica pouco, ou comunica mal, ou ambos. A deficiência de informação em CV torna-se evidente quando, mesmo os técnicos envolvidos na questão, estão de fora dos dossiers. Todos os que trabalham ou já trabalharam na Adm.Pública sabem disso: a informação circula mal. Os técnicos não são tidos nem havidos. Mas também os técnicos, muitas vezes, estão se borrifando para os dossiers e depois fazem-se de chocados com as consequências do borrifo.

Ainda estamos longe da situação em que, um técnico licenciado exija que a sua autoridade seja reconhecida. O que acontece nos gabinetes é que os técnicos estudam, analisam, comparam, investigam e elaboram pareceres, que depois passam ao decisores políticos, que são utilizados de acordo com a conveniência política. Ainda alguém tem que me convencer que o Governo não ultrapassou os técnicos do Ambiente na questão Murdeira. Um comentador aqui, por sinal técnico do Ambiente, diz que se sente um burro (SIC) porque depois de tanto mostrarem que a Murdeira não pode ser mexida, pelo simples facto de ser reserva ambiental protegida, que só pode ser usada para fins educativos ou científicos, mesmo assim o Governo decide avançar com o projecto.

Kiko, conhecedor de causa, faz um balanço entre a preservação da natureza e a necessidade económica e estou certo que ele conhece melhor que nós todos os meandros da coisa. Um outro comentador retorquiu o que ele disse sobre o mitigar dos impactos ambientais negativos, falando em uso de explosivos (?!). Vamos ver: temos aqui um técnico (Kiko) que fala de cara aberta; temos também outro comentador que pode ser um técnico do MA, mas tem a necessidade de anonimato. Não discuto o direito da pessoa ao anonimato; pergunto-me do porquê de tanto anonimato. Será que não estamos devidamente blindados de represálias? Ou será que transportamos o fantasma da repressão de tempos outros?

Estou tentando resumir as coisas na minha cabeça: parece que há leis que impedem literalmente que se construa estruturas na Murdeira, que não as científico-educacionais; parece que o Governo quer dar uma sobrevoada nessa nessas leis; parece que os técnicos são ultrapassados; parece que a sociedade tem medo de pôr a boca no trombone; parece que um magistrado resolveu por ordem nisso tudo. É tudo um reino de "parece". Esta sociedade tem que aprender a comunicar, intensamente, exaustivamente, antecipadamente, para que todos estejam alinhados, concordando ou discordando.

Notinha: já ouvi críticas de que por vezes não sou justo com as palavras (!!) pessoal, come on! A ideia não é ser justo (quem sou eu?); a ideia é falar, falar, falar...até perceber muito bem.

28.1.09

Estado de excepção

Lá vamos nós para um novo capítulo da novela Governo vs Magistrados. Desta vez o caso Murdeira. O Governo quer construir uma marina naquela baía; o magistrado Vital Moeda não quer. Lindo isso, não é?

Vamos ver, que democracia é essa que o Governo, poder executivo e não legislativo, faz a maioria das leis, cria projectos sem dar cavaco a ninguém (Ordens Arquitecto, Engenheiros, sociedade, etc), aprova os seus próprios projectos e manda executá-los, com as famosas adjudicações directas, sem passar por concurso público, porque são obras urgentes. O problema é determinar o grau de urgência. Pois, a maioria das grandes obras tornaram-se todas urgentes.

Mas onde pára o Ministério do Ambiente? Que democracia é esta em que o chefe do Governo manda e desmanda e os meninos ministros não piam? Ou será que não têm personalidade política?

E vem um D.Quixote do Sal: Vital Moeda. Enquanto que devia ser a Direcção do Ambiente o primeiro a ter a palavra, depois organizações ambientais, depois cidadãos...uma série de pessoas antes que um magistrado tivesse a necessidade de apelar ao seu sentido cívico, porque este magistrado também está incorrendo na tentação de se tornar parcial. Magistrados normalmente não se vêem, nem se ouvem, porque a sua missão demanda discreção. Mas, se ninguém é cidadão que se preze, então que venham Moedas, sim senhor.

Democracia não depende de nomearmos um dia. Significa "Estado de Direito", separação de poderes e intituições autónomas. Tudo tem de ser regulado por lei, para que valha; tudo tem que passar por procedimentos de conhecimento de todos. Por enquanto temos é "Estado de excepção".

Já agora, onde pára o Governo Sombra? Não seria melhor um Governo Luz?

27.1.09

Expo Deslocações

Inaugura hoje uma belíssima exposição chamada de "DESLOCAÇÕES", no CCP Praia, às 18:30, com a participação de 4 artistas portugueses:
  • André Cepeda
  • Edgar Martins
  • José Carlos Teixeira
  • Tatiana Macedo
A que se juntam 5 artistas cabovedianos:
  • eu
  • Abraão Vicente
  • Hélder Paz Monteiro
  • Omar Camilo
  • Júlio Silvão
Vão passar ainda uma série de filmes sobre o tema: “Fenómenos migratórios no recente documentário português”:
  • 28.01.2009 | 18h30: “À Espera da Europa”, de Christine Reeh (Portugal, 2006,58’) + “Lisboetas”, de Sérgio Tréfaut (Portugal, 2005,100’)
  • 29.01.2009 | 18h30: “A Fotografia Rasgada”, de José Vieira (França, 2001,52’) + “O País aonde nunca se Regressa”, de José Vieira (França, 2006, 52’)
  • 30.01.2009 | 18h30: “Lusofonia, a (R)Evolução”, filme colectivo produzido pela Red Bull Music Academy (Portugal, 2006, 60’) + “Pátria Incerta”, de Inês Gonçalves e Vasco Pimentel (Portugal, 2006, 52’) + “Bien Mélanger”, de Nicolas Fonseca (Canadá, 2006, 75’)
A coisa promete. A temática é actualíssima: Migrações. Os artistas são do pós 25 de Abril português e do pós Indepedência caboverdiano. A visão é outra, os sofrimentos são outros, as feridas são outras...não necessariamente desferidas por uns e por outros, mas por nós próprios a nós mesmos.

Não percam o debate.

26.1.09

Blog joint: Sobre o Ensino Superior


Imagem: Gianmarco Lodi

Imaginem que se pudesse dar tal ordem: "Acabem com o Ensino Superior em Cabo Verde!".

É pois impensável. Como poderíamos interromper o jogo económico que são os investimentos privados que empregam gente e pagam impostos, adicionado aos milhares de contos das famílias que circulam por essa via? Como poderíamos ter tamanho recuo político, interno e externo? Como podíamos prescindir deste atractivo ao investimento estrangeiro baseado na mão-de-obra altamente qualificada? A pergunta mais importante: que alternativas teriam os milhares de alunos que completam o 12º? As do passado faliram.

Ensino Superior em Cabo Verde já é vital, mas, convenhamos, como está também não dá! A começar pela quantidade de instituições privadas, que me parece de um aparecimento facilitado demais. Periga acontecer o que aconteceu com o grogue: na falta de cana para tanta produção, legaliza-se a fabricação através do açúcar. Ou seja, baixamos as exigências quanto ao nível dos professores, do equipamento e material didáctico, dos currículos, das certificações e acreditações, para permitir tamanha proliferação. Formamos técnicos à marretada, porque o sistema precisa andar.

A crise desponta. Já temos arquitectos formados no país que a Ordem de Arquitectos não reconhece. A Ordem de Engenheiros segue a mesma linha. É o sistema confrontar-se consigo próprio, auto regulando-se. Resta saber como vai se auto regular: reenviamos os alunos à escola, ou continuamos a baixar o nível para que a mediocridade continue a passar? A Educação que aprenda com a sua irmã Justiça, que políticas mal direccionadas acabam mal.

Sigam este tema em

23.1.09

Arte em questão II

Eilert Janssen
Estamos afastados dos debates estéticos da arte que se faz hoje em dia pelo mundo fora: Brasil, Europa, Japão, Estados Unidos, China, Senegal, Moçambique...Sim, Moçambique, um país n vezes mais pobre que nós economicamente, mas que consegue ter um discurso artístico muito mais evoluído que nós; que consegue ter e manter festivais de arte contemporânea (cinema, dança, artes visuais), que nós não conseguimos nem sonhar. Conseguem ter museus, galerias, uma escola nacional de artes visuais, associações e movimentos artísticos reconhecidos internacionalmente. Tem artistas formidáveis que conseguem estar em bienais, festivais e galeriais pelo mundo.

Estamos a milhas do circuito das relações internacionais da arte. Não conseguimos perceber o mecanismo das galeriais, dos curadores, dos comissários, dos contactos que é preciso ter, dos lobbies que é preciso construir. Não conseguimos colocar os nossos artistas numa bienal que fica aqui ao pé de casa: o Dak'Art.

Nem conseguimos capitalizar os movimentos, fatalmente efémeros por falta de gaz, que acontecem dentro da nossa casa. Não vislumbramos a oportunidade internacional do Mindelact, um punhado de gente percebeu o discurso do Praia.Mov, a remota Sopinha de Alfabeto não consta em nenhuma retrospectiva de comerações de dias de liberdades e democracias.

Temos uma classa política artisticamente analfabeta e desinteressada. Salvo raríssimas excepções, vejo uma figura política em exposições ou em peças de teatro, ou em concertos, sem que sejam oficialmente (obrigatoriamente quase) convidados. Nem fingem que gostam; não vão, puro e simplesmente.

PDM então?

22.1.09

Arte em questão

Revista Proteus
A decorrer na Praia, ao mesmo tempo, um workshop sobre escrita e realização de cinema e outro sobre organização e leitura crítica de portfolios artísticos. Claro, apanho os dois, porque essas oportunidades pintam de ano a ano. Felizmente na Praia já vai sendo com mais frequência, o que demonstra que a cidade da Praia vai sendo também um caso sério.

Voltando à Arte. O que é mais importante nos workshops é a oportunidade de questionar e de se questionar. O fazer da arte em Cabo Verde e na Praia, no meu particular, tem gerado interessantes debates. Ou seja, prometo ser mais (im)pertinente quando sair dessas acções. E mais, vêm aí mais intervenções artísticas na cidade.
E mais uma vez a triste constatação: o Estado mantêm-se alienada da Cultura viva e da Arte. A minha comparação do Ministério de Cultura hoje é: um dinosauro a ver para um pequeno robô, sem fazer a mínima ideia do que se trata. Ou em palavras mais formais: ANACRONISMO CRÓNICO. Mas hoje, isso não me incomoda. Viva a Arte!

Bianda raramente está de tão bom humor. Iupi!

21.1.09

Babilónia

Revista Continuum
Muitos amiguinhos da minha filha (4 anos) se comunicam em...português. Mas os pais não! Melhor explicando: os pais se comunicam entre si na sua língua materna, caboverdiano; comunicam-se com os amigos e com todo o resto da população, naturalmente, em caboverdiano. Mas, chegada a hora de ter filhos, de os "educar", toca a falar português. O pior é que muitas vezes um péssimo português. Nada de confusões com as famílias que tem o português naturalmente, há várias gerações. Essas falam entre si com base nessa língua. O que falo aqui é de uma moda novo-riquismo de "elevar" a cultura da família, fundamentada na teoria: eu não tive, mas o meu filho terá.

Frequentemente uma das paródias lá em casa é contar como a minha filhota se desenrasca neste mundo luso, que ela, forçosamente, vai entrando. Sou também eu apanhado a contar piadas e a rir, estupidamente. É que troçar com quem fala mal o português está no nosso código genético: achamos automaticamente piada.

Constato que: é preciso começar a ter sessões de conversas em português com a minha filhota, porque o sistema assume que as crianças todas falam português como se fosse natural. Ela vai entrar já para a escola "formal"e daí pela vida fora o português há de ser uma tabela do seu nível de inteligência. Que ela sofra por tudo, menos por essa estupidez. Que seja então uma excelente luso-falante. Entretanto ela já conta até 20 em inglês e sabe umas tantas palavras: thank you, apples, carots, good morning, garden....my name is Naia.

Babilónia significa a diversidade linguística, mas é um termo usado também para denominar "confusão".

19.1.09

Filmes da minha vida

Este filme é rigorosamente fotográfico! É do fotógrafo Anton Corbijn. Quando fotógrafos (bons) descobrem a linguagem do cinema, costuma resultar em obras visuais muito potentes, como é este filme. Ainda por cima uma dramaturgia intensa. Um filme é uma sequência de fotogramas. Cada segundo de cinema equivale a 24 fotogramas aprox. Este filme tem 122mn, que é como se fossem 175.680 esplendorosas fotografias. Tão a ver a loucura?!

Fim de fim-de-semana

Philadelpho Menezes
Sábia aritmética: 5 dias de trabalho, 1 dia para compras/arranjar as pequenas coisas lá de casa e 1 dia de absoluto ócio, dia de mimar os filhos e disfrutar do calor da família! 1 semana, um ciclo ideal.

Findado o fim-de-semana, retemperado, recarregado, tempo de recomeçar a luta: políticos para vigiar, reflexões para fazer, antagonismos, protagonismos, egos...já me apareceu a inspiração para a próxima exposição e tenho vontade de escrever 3 crónicas em simultâneo. Tempo de reabrir o debate. Durante o fim-de-semana, no dia do absoluto ócio, discutíamos em casa a positividade e a negatividade das acções. Ouvia as sábias considerações do meu progenitor. E talvez hoje esteja a inaugurar uma abordagem diferente.

Independentemente da abordagem, gosto de pensar que a minha acção é sempre positiva, mesmo sendo um impertinente. Negativo seria se a impertinência não viesse acompanhada de busca de soluções. Pois amigos, políticos, compinchas, artistas, patriotas, livres de espírito, aqui ninguém está sendo inimigo de ninguém. Só estamos a tabelar as nossas acções colectivas, para que sejam autenticamente positivas. Não barafustem quando defrontados com a crítica. Precisamos todos de reparos e o meu progenitor, dos tais anos de avanço que tem, lá me apanhou na contradição: agora ouve! abre-te à crítica tu também; vê lá se não seria uma melhor abordagem assim e assado...Pois, é só disso que se trata: reajustes.

Ao Pai.

16.1.09

Massagem de egos, masturbação mental e outros fenómenos psíquicos

Ricardo Galésio
OK, vamos lá mandar uns valentes PUTA-QUE-PARIU para desinflamar esses egos que começam a voar por aí. Quando os blogger começam a lavar roupa suja em público, é um muito mau sinal. Algures, algo não funcionou.

É assim: eu gosto de ter um blog; gosto de ser publicamente activo; detesto comentadores da treta; adoro comentadores construtivos, anónimos ou não; adoro certos blogs; gostei da ideia do jornal Nação, de nos escarrapachar numa das suas páginas; detestaria a ideia de nos tornarmos vaidosos com isso; gosto de blogs "engajados", de blogs com personalidade. Um blog é um acto individual, mas alguns de nós temos uma acção pública, o que resulta num acto individual com sentido público. É no ponto de equilíbrio entre estas duas dimensões (pessoal/público) que precisamos encontrar a ética da nossa acção. Que se lixe a ética? Então que se lixe a vida pública; tornamo-nos individualistas e anulamos a nossa "utilidade" pública.

Dois blogger, grandes amigos, que não deixarão de o ser por post e meio, engalfinharam-se a propósito de um assunto. Interpretem isso como uma deslocação do ponto de equilíbrio de que já falei. Tenham calma; antes de ajuizar, atentem nas mensagens subliminares que isso contem. Aliás, caboverdianos, é chegada a hora de deixarmos de merdas de sentimentalismos, de deixarmos de atentar à forma das pessoas e de prestar mais atenção no seu conteúdo. Numa sociedade democrática (de facto), moderna, cosmopolita, política (no bom sentido), o debate é entre ideias e não entre comadres. Quando dois intelectuais de grande valor, como são esses dois aí, se engalfinham, pode até haver hiperbolação de egos, mas acaba sempre sendo uma análise...só que aos berros.

15.1.09

Catarse da Justiça

Peer Fischer
Vamos percebendo aos poucos que a Democracia foi um grande marco político na nossa história, ainda que esta descoberta, progressiva, se faça com algum trauma.

O dia 13 de Janeiro é uma justa efeméride, justamente chamado de "Dia da Democracia", mas não é justo chamá-lo "dia da liberdade". Respeito para com a história: "dia da liberdade" é 5 de Julho, dia em que nos tornámos Nação. Não pode haver liberdade mais elevada do que um povo com direito à sua Nação. A Democracia foi uma viragem política importante, fundamental até diria eu, mas não significa liberdade, nem à priori, nem à posteriori. Vamos tendo liberdade, a perdendo, a repondo, requestionando, refazendo. Liberdade não é um dado adquirido e permanente.

Democracia implica a noção de Estado de Direito, logo para se ter um boa Democracia, temos que ter um bom Direito. Como poderá a Democracia ser boa no actual estado da Justiça? Como poderá a Democracia funcionar, com o estado actual dos tribunais? Com o poder executivo (Governo) a elaborar a maior parte das leis, em vez do Parlamento? Com um agir da Justiça perfeitamente anacrónico? Com uma imprecisa regulação da actividade económica?...Liberdade em democracia não é uma garantia dada pelo Direito? Conclusão, não somos tão livres como pensamos.

Mas foi preciso acontecer uma incongruência, uma contradição lógica, a libertação de um crimonoso confesso, por "permissão da lei", para que finalmente se desse o grito: "A justiça bateu no fundo!". E talvez haja uma catarse no sector da Justiça, que, ao começar a levantar-se de novo, tenha uma cara moderna, ágil, elegante e consistente. Espero também que os políticos tenham aprendido a seguinte lição: em democracia, as políticas estão directamente ligadas à vida social. Mais dia, menos dia, a porcaria vem à superfície.

14.1.09

Biandicator

Inaugurada nova secção aqui no Bianda, para destacar um facto por semana, que mexe com o meu sistema nervoso. É o Biandicator, aqui no lado direito ->.

Cinema, como te quero!

Revista Crua
Cabo Verde viveu parte dos seus sonhos vendo filmes. É conhecida a capacidade do crioulo em imitar as maneiras das estrelas de cinema. S.Vicente é um laboratório vivo deste fenómeno. A partir de uma determinada altura porém, vimos a possibilidade de FAZER cinema. Porque não?

Já tinha referenciado Ismail Xavier, crítico e investigador do cinema brasileiro. Recordo uma frase: "
deve-se pensar o cinema além do espectáculo, como uma forma de pensamento". Nesta linha podemos pensar num cinema-documento. A questão do financiamento fica ao critério da "utilidade" de tal documento. Outros autores afirmam: o cinema é, por excelência, a arte da catarse social. Pois, quantos assuntos já "explodiram" por causa do cinema? Veja-se a guerra no Iraque e as motivações questionáveis de USA, postas e nú em filmes.

Gostamos de nos esconder detrás da impossibilidade de pagar certas coisas, embora não se pestaneje em comprar um carro de 5,6,7,8 mil contos. Mas também, quem disse que temos que fazer um cinema de alta produção? O que nos ensinou Glauber Rocha? Ou Lars Von Trier? O que sabemos de Estética da Fome, Dogma 95, Cinema Pobre?

Nesta segunda-feira iniciei o meu 2º workshop de cinema, sempre na esperança que um dia possamos realizar o sonho de fazer cinema. Pois é verdade que:
o sonho é o motor da vida.

Erro(s) sistemático(s) - sequelas

Marek Haiduk
O verniz vai estalar para os lados do Ensino Superior (vide post "Erro(s) sistemático(s))

Dois dos meus ilustres comentadores deixam a sua visão:

Segundo Redy, as Ordens devem mantêm-se firmes; Univesidades devem ser postas no tribunal por venderem gato por lebre; Governo assume responsabilidade política (como, pergunto eu?); alunos que voltem para os bancos da escola e completem o curso, como deve ser, pagos pelas próprias universidades, digo eu. Sociedade civil é uma abstracção. Os pais estão loucos. Gosto desta posição, assino em baixo e tomara que alguma dessas coisas aconteçam, mas duvido Redy.

Kiko, mete o dedo bem no olho da ferida. Ensino Superior sim, mas qual e como? Num país que vende massivamente o turismo, sem no entando ter os itens todos, não deveria fazer uma aposta massiva em Ensino Técnico-Profissional? Ora Kiko, usando uma parábola de Nietzsche, nós (CV) somos uma corda esticada entre o super-homem e o burro (com as devidas desculpas ao burro animal). Acho que a corda precisa rebentar mesmo...ainda que a corda vá rebentar no ponto dos desgraçados dos alunos.

A seguir em cenas dos próximos capítulos.

12.1.09

Erro(s) sistemático(s)

Quando as políticas, ausência ou deficiência delas neste caso, tocam a vida das pessoas é que começamos a dar conta que Política não é um mero jogo de palavras; tem consequências; e graves! Vejam o que está acontecendo com a Justiça.

Queríamos Ensino Superior (ES) no país a todo o custo e assim o introduzimos, de qualquer maneira. Alguns dirão: tínhamos de começar por algum lado. Sim, mas ES não é coisa que se inicia, como se inicia um bar. E as vidas que condicionamos de forma indelével?

Mais uma vez começamos e só depois pensamos em regular. E assim nasceu a Universidade Piaget CV, uma pequena aberração do sistema. Esta univ iniciou um, pasmem, curso de Arquitectura!! A Ordem de Arquitectos (OA) avisou que o curso não cumpria com alguns requisitos e poderia vir a não ser reconhecido. Dito e feito. Saiu a 1ª fornada de arquitectos e a OA não os reconhece. Crise. Um dos alunos põe a boca no trombone, acusando, pretensiosamente, a OA disto e mais aquilo. Mas em nenhum momento aponta um dedo à sua univ, que vende tudo menos qualidade. Disseram-me que a mesma celeuma está a passar-se entre os formados em Engenharias e a Ordem dos Engenheiros.

Pronto. Corrigimos a situação um bocado com a criação da Universidade de Cabo Verde (UnivCV), que tem trabalhado para recuperar o prestígio do ES, não sem um rol de intrigas. Ao menos introduziu-se a noção de que o ES não se faz de um dia para o outro. No meio tempo em que a UnivCV luta pela dignidade do ES, pipocam universidades, como se plantação de tomates se tratasse.

Agora a parte humana. Os alunos queixam-se de não ter bilbiotecas, laboratórios, de não ter aulas práticas, de faltar professores, de terem professores de bradar aos céus, de abusos das reitorias, de pagarem muito e de receberem pouco. Os professores queixam-se de faltar condições e material didático, de falta de organização e de abusos das reitorias. As empresas queixam-se de um incrível despreparo dos alunos formados in CV. E os alunos ainda não perceberam a alhada em que estão metidos.

Não estaremos a comprometer perigosamente uma geração inteira? Como diria o Chefe da Sombra (vulgo, Oposição), é um escândalo Sr.Primeiro-Ministro!

10.1.09

Um pé fora de casa

Imagem da revista "Crua"
Acontecem coisas incríveis, com o simples facto de se pôr um pé fora de casa. O mundo lá fora está sempre fervendo, cozinhando surpresas para o dia a seguir. Este Sábado, acordei com aquela boca seca, típica de ressaca, não importa agora o grau, mas tinha obrigações: compras, passar no trabalho, um programa para completar, e-mails para enviar: e tinha que me organizar. Lá pus o pé fora de casa.

Primeiro um café, onde acontece a primeira surpresa: um casal de amigos, agradáveis, que há muito que não os via, roubam-me deliciosamente uma parte do Sábado. Um assalto bom.

Segundo, ía a entrar para o carro quando aborda-me um jovem, tratando-me por Sr.César, meio sem jeito, desculpando-se pela abordagem, mas que há muito que procurava uma oportunidade de falar comigo, que segue o que faço e digo, que ele também tem ideias e que queria que eu o ajudasse de alguma forma a mostrar o seu trabalho. Confesso, fiquei baralhado na minha repentina posição de fama. Tratei, antes de tudo, de tirar o "senhor" e resolvi "perder" mais 20 minutos. No final, ele já sabia que eu era um simples mortal e eu já sabia que há mais gente atenta a pequenos detalhes. Que gratificante!

Tercerio, uma surpresa lunática. Quando já vinha no carro, aparece do meio do nada, correndo para a estrada em minha direcção, uma velha amiga, das mais belas nos seus remotos 16 anos, agora um pedaço de osso, restos de carne e pele a cair, gritando! Parei, ela entrou no carro, pediu-me que a levasse dali. Delirava. Um doido queria matá-la. Falava em torrentes desordenados. Estava possuidamente pedrada e cheirava mal, do hálito, dos sovacos, dela toda. O meu coração cortou-se de tristeza a ver a miséria humana a acontecer debaixo dos meus olhos, dentro de meu carro. Contive-me. Falei com ela da mesma forma que falo com a minha filha de 4 anos, calmamente, até que ela se acalmasse também. Pediu-me que a deixasse num lugar seguro. Fomos conversando, ela foi recuperando o tino e eu fui pensando que a única coisa que podia fazer por ela, era precisamente dar-lhe os 10mn de atenção que dei. Devolvi-lhe à estrada.

Finalmente entrei na minha vida, aquela que tinha planeado antes de pôr o pé fora de casa.

9.1.09

Pensamentos

"...como se pode pensar a política num estado de beligerância social, de perda de garantias e direitos, de total anomia jurídica? Nesta zona de incertezas jurídicas, o que significa agir politicamente?"
Giorgio Agamben, filósofo contemporâneo italiano.

Cidade baixa

Passou na CEB, ontem, dia 8. É assim: filme de porrada, ou pornô, ou de Steven Seagal, já sabemos que é porcaria anunciada. Mas certos filmes são lançados com a pretensão de cult e quando erram o alvo ficam mesmo mal. Desde "Cidade de Deus" que o (excelente) cinema brasileiro encontrou a fórmula para sensibizar o mundo para a sua miséria: escarram na sua cara toda a violência, a droga, a prostituição, de forma aberta. Bom, "Cidade de Deus" e "Tropa de Elite" fizeram isso com maestria, mas o resto do pessoal, realizadores novatos, precisam tomar cuidado com esta "estética da miséria".

No caso de "Cidade Baixa", uma novelinha disfarçada de drama social, ainda por cima com uma referência subjectiva ao "Cidade de Deus", comete um pecado que me irrita solenemente: usar a miséria de forma oportunista. Se tirassem aquela estorinha daquele cenário e pusessem em outro cenário qualquer, continuaria a ser uma novelinha básica; continuaria a não dizer nada sobre os problemas que, supostamente, suportam o filme.

Valeu no entanto a interpretação de Lázaro Ramos, que vi no incrível filme "Cafundó" , e Wagner Moura, o célebre "Capitão Nascimento".

O cinema brasileiro contemporâneo é INCRÍVEL. Está inscrevendo Brasil na história do cinema mundial, com filmes de antologia, tais como: "Central do Brasil", "Abril despadaçado", "Cidade de Deus", "Eu, tu, eles", "Cafundó", "O cheiro do ralo", etc., etc. Ao Centro de Estudos Brasileiros, que cuidem da qualidade dos seus filmes, porque opções não lhes faltam.

A propósito de cinema, uma frase de Ismail Xavier, crítico de cinema brasileiro: "...deve-se pensar o cinema além do espectáculo, como uma forma de pensamento, experiência de duração, profunda intuição vital, que traz de volta um elo fundamental com o mundo.". Para nos lembrar que o cinema deixou de ser um luxo, para passar a ser uma das principais formas que os países se realizam culturalmente. Custa muito? Custo menos que os benefícios. Podemos discutir isso.

Let's talk about politics, baby

A inscrição significa "Cego?" em polaco. Autor: Zbigniew Kaja
O que é que há de errado em falar de Política? Ou, ainda mais: o que é que há de errado em fazer Política? Mas, já não somos todos responsáveis políticos? Então não pagamos impostos? Então não somos, como já tive oportunidade de ouvir/ler, accionistas do Estado? Então não somos cidadãos, um conceito político? Porque é que existe uma percepção suja da Política?

O meu politólogo preferido, Edson Medina, expõe o problema da seguinte forma:

"Contribui fortemente para esse ambiente (crispação política) o facto de que em Cabo Verde a maior parte dos "políticos" não se tratam de "self made men", com percurso e sem necessidade de criar laços com o Estado. Pelo contrário, são figuras que querem se perpetuar no poder, garantindo regalias e benesses, transformando os partidos em máquinas de interesses. Nessa luta impõem um estilo populista, onde os recursos fundamentais são a intriga e o assassínio de caracteres, instrumentalizando a dicotomia bases/elite, em função dos seus interesses, como se os partidos não vivessem dessa constituição plural e estratificada da sociedade." In jornal A Nação, 8/1/2209

A Política não é nada mais do que a "coisa pública". Como disse um outro politólogo: a Política começa assim que pomos um pé fora de casa. Partilhamos as mesmas leis, as mesmas infraestruturas, os mesmos serviços. É por demais importante que possamos perceber que, em Estado de Direito, todo o cidadão é uma parcela do Estado, que Parlamento só regula o nosso funcionamento comum, que Governo só faz a gestão do comum e que a Justiça garante (devia) o Direito, que suporta esta filosofia. Ou seja, os políticos cuidam do Estado, por delegação nossa. Mas, não podemos de nos isentar da Política. Seria como entregar os nossos filhos na escola e esperar que esta seja responsável por toda a sua educação. Se a sociedade, dita civil, não se activar politicamente, exigindo, mas também agindo, estaremos a permitir o espaço da tal instrumentalização e continuaremos a dar oportunidade para que "sujem" a Política.

Como tenho dito aos meus colegas, precisamos re-inventar a sociedade. Ter uma sociedade mais justa implica corrigir as suas instituições, sendo os da Política as mais importantes, até pelo dinheiro que custam.

7.1.09

O(sem)posição

Em 2009, diz o Governo e a Oposição, vai ser o ano disso e aquilo. Ou seja, os outros anos atrás eram a fingir?! O Primeiro-Ministro acordou para a sua política cultural, Jorge Santos, também ele, tem finalmente a sua fórmula mágica: GOVERNO SOMBRA. Uau!

Não devia a Oposição ser isso desde o início? Que tem 2009? Frisson de eleições? Já cheira a pele da cadeira do poder? Se essas fórmulas mágicas aparecem agora por conta das eleições, serão credíveis? Naquela onde do mais vale tarde do que nunca, estou ansioso para ver esse Governo sombra, se é que se poderá vê-lo, porque tenho lido insaciavelmente todas as entrevistas de Jorge Santos e ainda não percebi que políticas que ele defende, além de berrar no Parlamento.

O que terá JS a dizer sobre Economia? Que políticas terá para a Educação? E a Formação Profissional? E a Segurança? E a Justiça? E o Desporto? E o Ambiente? E a Cultura? Estou curioso, porque ainda não ouvi nada consistente. Sobre a Cultura, nunca ouvi nada de nada da boca da Oposição. Que venha a sombra.

6.1.09

à conversa com Carlos Santos (Kiko)

Todo o miúdo teve amigos inseparáveis. Kiko foi um deles para mim. Em S.Vicente vivemos uma adolescência incrível, com mais outros conpinchas: Péricles, Caliss, Fré, Paulo Noel.

De repente crescemos e tornamos cidadãos com tremendas responsabilidades. Kiko, agora Carlos Santos, personifica a liderança que vejo para S.Vicente. Nas nossas longos conversas, fartamos de procurar explicações e soluções para S.Vicente. Andamos pelo S.Vicente escondido, pelos bairros clandestinos, pelas casas de lata, e falámos muito de política. Concordamos em muita coisa:
  • Com a actual concepção de "luta política" não vamos a lado nehum. É preciso recuperar a seriedade na política. Com a democracia criámos um dilema: para angariar e manter votos, entramos pelo discurso demagógico e por uma prática política esvaziada de conteúdo, o que resulta no afastamento dos cidadãos que são técnicos e estão interessados num discurso mais inteligente.
  • As acções colectivas são essenciais para conseguirmos alguma transformação. Precisamos re-inventar a sociedade, re-inventando cada colectividade que a compõe. O sentido da liderança deve apontar para uma acção que possa ser avaliada concretamente e positivamente. Por enquanto, temos dificuldades em apontar um bom exemplo de colectividade, seja ela grupo, associação ou partido.
  • Falando de Cultura, enquanto não partilharmos todos, do Presidente ao menino de escola, determinados valores e desígnios, as acções continuarão a ser circunstanciais. O combate pela Cultura, ao nível de Estado, deve se ocupar de preocupações mais elevadas, como sejam a Educação, só para apontar este, no sentido de melhorar a nossa acção colectiva.
À conversa com Carlos Santos, ganho confiança e esperança de que a próxima elite política possa corrigir as burradas que a presente vem fazendo.

5.1.09

Blog joint

Há gente com muita ansiedade. Isso é óptimo porque gera motivação, com o devido cuidado, para não deitar tudo a perder, antes mesmo de existir.

É impressionante como que, antes de haver seja o que for, já ouvi críticas severas, algumas até com laivos de derrotismo. Esta ideia foi uma como as outras tantas em que já participei. Esta ideia tem no entanto uma novidade, que é o uso da blogosfera como espaço de colaboração. Mas esta ideia, principalmente, não está clara nas nossas cabeças. Vamos, calmamente discutí-la. A ideia era, na última semana de Janeiro, aparecer o primeiro tema.

4.1.09

À conversa com João Branco

Existe definição mais importante numa sociedade que a de família? Estou cada vez mais convencido de que não.

Das coisas que mais me inspiram na vida é visitar pessoas, também inspiradas, em suas casas. É onde se revelam na sua grande intimidade. É onde se definem pelas cores pintadas nas paredes, pelos objectos, pela música, pela conversa, mas sobretudo pela família. A do João passou a ser minha um pouco. Apresentando:

Inês, a filhinha codé, logo a rainha total da casa. Uma lindeza de 3 anos.

Laura. Quando fui ao Mindelact pela primeira vez, saltou-me à vista uma criança super expressiva. Fazia pequenas performances a toda a hora, com toda a gente, incrivelmente divertida. Agora conheço-a mais. Mostrou-me os seus desenhos que tema mesma expressividade das suas “performances”. Um encanto de 11 anos.

Bety. Mãe, mulher, chefe, artista…uma personalidade. Das pessoas que se conhece às prestações. Cada prestação é melhor, a dobrar, que a anterior. Esta senhora é actriz, faz uns figurinos lindíssimos para o teatro, faz marionetas e máscaras lindíssimas. Anda em Belas-Artes e vou torcer que surpreenda este país ainda mais.

João, vivendo num reino de mulheres com tais personalidades, logo o elo mais fraco, eheheh. Mas uma das pessoas mais importantes deste país. Aprendamos a conviver com estas constatações. Este homem constrói o que vivo dizendo que não construímos: PATRIMÓNIO. Ele vai estar ligado aos ossos da nossa história, por obra e não por placas de inaugurações e por discursos. Certa vez, estando eu intrigado de como o Mindelact acontece cada ano, sempre com a mesma qualidade, ultrapassando todas as dificuldades, perguntei-lhe qual seria o segredo e ele respondeu: comungamos um sentimento de família e por isso todos lutam para que sobreviva. É pois uma dos nossos temas predilectos de conversa, mesmo quando não dizemos explicitamente a palavra “família”. Estamos sempre a falar de associação, projecto, grupo, colaboração, que são (deviam ser) formas de dizer: família.


E ainda, à conversa com João, ouvimos o disco do seu pai, José Mário Branco, que passei a saber que é uma das personalidades mais respeitadas de Portugal. Caso para dizer: há famílias que nos inspiram.

3.1.09

Mindel di meu

Fin d’on na Mindel, sab pa fronta!!

A tradição da passagem de ano em S.Vicente é inimitável em todo o arquipélago. Vamos lá assumir isto, sem complexos de inferioridade, por parte de badios, foguenses, santatonenses e outros enses, e sem complexos de superioridade por parte dos mindelenses. É um forte de S.Vicente, como outras festividades são mais rijas em outras partes de CV. Mas o pessoal tem que perceber uma coisa: cada lugar no mundo tem a sua forma de passar d’ano e todos fazem-no dentro do calor da família e dos amigos. Estive em S.Vicente, mas senti uma falta danada da minha família, minha filha, meus amigos do peito, das famílias dos meus amigos do peito, que me tratam de filho. Vim para S.Vicente para reviver a linda festa de rua e ter um fim d’ano diferente…não necessariamente melhor.

Lembro-me sempre desta frase sábia: os lugares são as pessoas.

O(s) erro(s) de JMN (o pior)

O Premier encontrou a fórmula mágica para, finalmente, lançar o seu programa para a Cultura: Entretenimento Cultural. Ora, está aqui uma definição que devia pôr todos os intelectuais e “homens da Cultura (!?)” com os cabelos em pé.

O conceito, puro e simplesmente, não existe numa Política Cultural de Estado. Posso aceitar que tal faça parte do programa de um Ministério do Turismo (que já precisa existir), que significaria uma preocupação em ter entretenimento, ao qual se agrega valores culturais. Mas, um Ministério da Cultura com tal preocupação é uma ofensa à própria Cultura. O que vai acontecer, se esta maravilhosa ideia pegar, é que o Estado estará a incentivar uma Cultura feita depressa, dada a urgência do mercado. O que me dirão, eu que faço fotografia? Que pare de fotografar a desgraça das nossas cidades, porque é preciso um produto mais “atractivo”? Ou, posto a pergunta de uma outra forma: quem terá mais possibilidade de angariar mais incentivos: o gajo que faz postais bonitos ou os da minha gente, que tem procurado retratar o lixo que deitamos para debaixo do tapete? Qual é a mensagem implícita neste "Entretenimento"? Que é preciso fazer uma Cultura produtizada? Que devemos fazer um estudo de mercado para saber se usamos mais azul ou mais verde na pintura?

Recordo-o, Sr.Premier, a sua preocupação deve ser a Educação, o Património, a Legislação, a Investigação, o Financiamento de Cultura, mas sabendo que isso tudo terá efeito a longo prazo. Quando começar a sair fornadas de artistas formados em escolas; quando as cidades começarem a se organizar em torno do seu património arquitectónico; quando existirem galerias e museus para exposições de arte; quando festivais de música, dança, teatro, ganharem consistência e visibilidade; quando as pessoas com capacidade financeira começarem a se interessar pela arte; quando essas coisas começarem a ser realidade, teremos cidades com mais interesse de visita e aí a Cultura estará a prestar um serviço ao Turismo. O que é tremendamente errado é pôr o Turismo como meta da Cultura. É uma aberração.

Sr Premier, já ouviu falar em crise de valores? Pois, tenha cuidado em veicular maus valores. Ai da Cultura quando começar a se orientar por essas cenas que o Sr tem dito.