Kiko, como o chamamos, mas formalmente Carlos Ferreira Santos, Eng.Naval, envolvido no caso Murdeira, deixou aqui um grande depoimento, que por ser tão grande foi "promovido" a post (Kiko, ficamos saldados na questão das cervejas, eheheheh). Então aqui vai, ipsis verbis:
"Meu Caro César, vamos comunicando...
O principal problema aqui é que cada um tem um conhecimento isolado do caso, isso gera então a confusão. O Colega do Ambiente só tem conhecimento dos aspectos ambientais. O Colega da Economia tem conhecimento dos aspectos económicos. O Colega das Infra-Estruturas tem o conhecimento técnico do dossier de construção etc, etc.. no fim o Ministro junta todos os pareceres, incluindo o parecer jurídico e toma uma decisão, apoiado pelo Conselho de Ministros.
Entendo a indignação do Colega do Ambiente… mas Cabo Verde não é só ambiente. E o colega perde toda a razão quando os técnicos das infra-estruturas apresentam um conjunto de medidas que elimina ou reduz a alguma insignificância qualquer impacto que se possa ter no ambiente e que já não está a ser causado agora mesmo.
Podíamos rapidamente entrar com alguns aspectos e aproveito para tranquilizar o César para os principais pontos que ele focou:
1 – "Alguém tem que convencer o César que os técnicos do ambiente não foram ultrapassados".
Não foram ultrapassados, as suas razões e justificações não foram suficientemente fortes para anular o projecto, só isso. (lembremos dos outros pontos que já considerei…)
2 - "Murdeira não pode ser mexida, pelo simples facto de ser RESERVA AMBIENTAL PROTEGIDA, que só pode ser usada para fins educativos ou científicos, mesmo assim o Governo decide avançar com o projecto".
Nada mais falso e aqui começa a grande confusão meu caro César.
Para já não existe o termo técnico Reserva ambiental protegida. Existem sim várias classificações para Reservas naturais. E no Caso de Murdeira é uma RESERVA NATURAL PARCIAL MARINHA (Decreto Lei nr. 3/2003 de 24 Fevereiro).
Se calhar o "parcial" estraga a festa dos ambientalistas, mas a classificação é feita conforme o parecer deles. Quisessem e tivessem conseguido justificar uma Reserva Natural Integral, ali sim o debate estaria encerado. No entanto Murdeira não é uma Reserva Natural Integral e é pura fantasia que não pode ser mexida. Ou seja os próprios ambientalistas não reconheceram a necessidade de ser a Murdeira uma Reserva Natural Integral. ( e já não pode, até porque ali existem já diversas construções e haverão mais na orla).
Assim na reserva natural parcial marinha é possível “aproveitamento racional da zona em questão, sem por em causa a capacidade de renovação e estabilidade ecológica da mesma”.
E é precisamente o que se pretende fazer…. e o Dr. Moeda que entende mais de lei, mais de ambiente, mais de marinas que todos os Ministérios e técnicos juntos, não quer…. Grande Estado de Direito o nosso.
Mais ainda, a Murdeira é uma ZDTI (Decreto-Regulamentar nr. 12/2005 que declara as orlas Marítimas de Algodoeiro e Murdeira de ZDTIs “para nelas se implantarem infra-estruturas turísticas e ou hoteleiras, v. G. Marina Ocêanica, unidades hoteleiras e similares de qualidade…”. ).
A questão legal é puramente esta, mas… esquecemos que há o Dr. Moeda que entende mais de…. e de …… etc.
3 – Explosivos na baia????
Só se for para explodir a cabeça de alguém…. César, és candidato?
Primeiro e o que ninguém disse: a marina não será construída na baia da Murdeira mas sim em terra. É uma marina em terra minha gente (sim existe sim...). Os impactos dessa construção são iguais ao impacto de uma construção qualquer na orla (quer dizer um pouquinho mais). Não há explosivos na baia.
No entanto haverá um canal de navegação restrito e só esse pode ser usado (como uma estrada no mar… ena pá que giro). Abrir esse canal, SEM explosivos causara um impacto temporário, mas considerável na baia. Aqui ninguém consegue fugir.
Mas porque é que a marina é feita longe da Baia (fora na zona reserva marinha parcial, mas sim na zona tampão) e em terra e porque é que não se usa explosivos? Porque ao contrário do que o César diz, essa Ministrada ouve sim as opiniões dos técnicos. Neste caso pelo menos a minha opinião foi sempre ouvida…SEMPRE.
4 – “Parece que há leis que impedem literalmente que se construa estruturas na Murdeira, que não as científico-educacionais; parece que o Governo quer dar uma sobrevoada nessa nessas leis”:
Não, já vimos que não… não se pretende sobrevoar nada, aliás a Lei nem sequer diz isso… Big Fantasy.
5 – “Parece que os técnicos são ultrapassados”:
Não, já vimos que não.. ninguém é ultrapassado, são todos ouvidos, mas o que não podemos querer é que a nossa opinião seja aquela a ser adoptada. Há mais opiniões que devem ser levadas em contas. Neste caso eu confiro: a minha opinião e de muitos outros foi levado em conta e, talvez por termos justificado melhor a nossa posição técnica ela vigorou. Aliás, alguém já ouvir falar em “clean ou green Marina”. Pois deviam…. Os impactos são tão reduzidos que justifica sim… principalmente se adicionados os impactos sócio-economicos.
6 – “Parece que a sociedade tem medo de pôr a boca no trombone”
Eu não tenho.. o César não tem. O John Branco também não? A Familia Andrade de Monte Sossego…. e nós somos o quê? Society?
7 – “Parece que um magistrado resolveu por ordem nisso tudo. É tudo um reino de "parece"….
Parece mesmo …. E aqui começa o Estado de Direito Democrático (com regime politico parlamentarista) a degradar-se… completamente até.
Felizmente entende o Sr. Magistrado mais do assunto do que todos nós… que os Ministros, que os assessores, que técnicos, que as Direcções Gerais… que tudo. Aliás, os Magistrados são umas gandas Chico-Espertos. Só não entendem mesmo é de justiça… ou não teríamos assassinos confessos a vadiar entre nós. Que irónico esta minha sociedade.
Só dou razão ao César na ultima parte… precisamos de facto comunicar… muito até.
E para chatear, aqui vai ainda um monte de recomendações para mexer com a cabeça de que não esteve por dentro do dossier e acha super engraçado insurgir-se contra o Estado, quando o seu representante executivo, o coitado do Governo, mais não faz do que cumprir a lei:
Arranjem tempo e deliciem-se:
recomendações a seguir:
a) Deve-se referir que o projecto apresenta-se num ambiente legislativo extremamente favorável, onde o próprio Governo promove a implementação do projecto através da criação da ZDTI de Murdeira e do Plano Director das Infra-estruturas de apoio a Náutica de Recreio, onde ambos prevêem a construção de uma Marina na Baia da Murdeira como forma de trazer qualidade aos empreendimentos turísticos na ZDTI de Murdeira. De facto, a náutica de recreio é um segmento do turismo de luxo, que juntamente ao turismo do golfe, maiores receitas produz, indo de encontro a estratégia do Governo, de promover turismo de segunda residência e de alta qualidade, fugindo ao turismo do “all inclusive” e curtas estadias. Assim o projecto de marina enquadrado no complexo turístico da Murdeira enquadra-se completamente nesta estratégia.
b) Necessário será de referir que uma vez apostado no Turismo, Cabo Verde e com isso a Baia de Murdeira deverá concorrer com vários outros destinos turísticos e é considerável para a oferta turística se um complexo apresenta ou não a possibilidade de náutica de recreio. Dai a necessidade de considerar este facto como um impacto a se ter em conta.
c) O EIA apresenta duas classes de impactos, aqueles que acontecem na fase de construção do projecto e aqueles que acontecem durante a sua exploração e manutenção.
d) Relativamente a esta primeira fase, construção, o maior impacto que se prevê serão as obras de dragagem para abertura do canal de entrada para a Marina. Esta dragagem é nociva ao ambiente marinha, podendo causar poluição e contaminação bioquímica, acreditando-se no entanto que seja um impacto temporal. Os restantes impactos e por se tratar de uma o obra em terra, serão os mesmos impactos que serão causados pelas dezenas de obras de construção civil ao longo da orla da Baia, para as quais serão necessárias seguir praticas de boa gestão ambiental.
e) Em relação a fase de exploração da marina, o EIA é pouco profundo na apresentação dos impactos, limitando-se a atribui-los a possíveis acidentes e má conduta ambiental, o que não é completamente satisfatório. De facto, a exploração de marinas convencionais causa impactos consideráveis ao ambiente marinho, que se resume em pratica pela má conduta e gestão ambiental dos utilizadores. Assim a tendência mundial para o segmento da náutica de recreio é promover os “green e clean marinas”, que são estruturas de recreio que desde a sua construção e em todas as fases da sua exploração são seguidos regras severas de gestão e manutenção, causando um impacto reduzido no ambiente. Assim recomenda-se que a Marina da Murdeira seja uma “clean marina” construída com matéria que não se degradam e não necessitam de qualquer tipo de manutenção. As práticas na marina devem ser as do “eco-friendly boating” também segmento e pratica ambiental responsável para os utilizadores da náutica de recreio. Essas regras são bem definidas e devem ser adoptadas numa possível Marina na Baia da Murdeira. Estas práticas prevêem e eliminam já inúmeros tipos de acidentes ambientais, garantido a segurança ambiental da Marina. Assim nessas “clean marinas”, todos os dispositivos têm segurança dupla contra possíveis derrames de quaisquer líquidos, é proibido a limpeza, reparações e manutenção de embarcações (podendo estas serem feitas em locais próprios), e se autorizados, os líquidos utilizados são bio-degradaveis e vendidos na própria marina, promovendo também um circuito comercial etc.
f) Ainda na fase de exploração da Marina, um impacto considerável que deveria ser levado em conta no EIA seria a utilização de anti-foulings no casco de embarcações. Sabe-se hoje que anti-foulings convencionais contêm anti-vegetativos (biocidas), altamente nocivos e destrutivos ao ambiente marinho. Obvio que numa marina “Clean Marina” e em toda uma reserva natural seriam de proibir completamente os anti-foulings convencionais. Felizmente existem hoje várias alternativas para anti-foulings, que no entanto já não se baseiam na capacidade anti-vegetativa, portanto uma massa porosa com biocidas nos poros, mas sim em conceitos a base de teflon, vinyl ou silicone que cria uma superfície lisa, não oferecendo possibilidade de aderência a organismos marinhos, em vez de criar uma superfície tóxica a esses organismos. Sobre este tema, existem já convenções internacionais (IMO) que proíbem a utilização de anti-foulings a base de biocidas e cobre em embarcações de menos de 25 metros. Infelizmente na marinha comercial enormes quantidades desses anti-foulings continuam a ser utilizados, por serem mais baratos e eficazes. No segmento da náutica de recreio, existe uma grande abertura e tendência para a utilização de anti-foulings amigas do ambiente, já que trata-se de um hobby onde os custos adicionais (visto as pequenas quantidades) para aquisição de tintas, anti-foulings e detergentes bio-degradáveis ou amigas do ambiente, não é de todo considerável. Uma “Clean Marina” deve promover essas práticas e comercializar ela mesma este tipo de produto.”
g) Também na fase de exploração da Marina e focado no EIA, há a considerar os possíveis acidentes ambientais que um tráfico elevado de embarcações poderia causar, bem como a introdução de espécies invasoras (exóticas) arrastadas nos cascos de embarcações para um habitat exclusivo. Para opinar sobre estes dois aspectos, a primeira análise a fazer seria sobre o próprio grau do tráfego da Marina. Sabe-se que se trata de uma Marina Residencial Turística, quase que exclusivamente de apoio a estrutura residencial, podendo prestar algum apoio a embarcações passantes. Tratando-se de uma estrutura residencial de segunda ou terceira residência, cujos lugares (berços) são normalmente vendidos juntamente com a propriedade a adquirir (até 80% da capacidade da Marina), é facto que os utilizadores dessas segundas residências pouco tempo passam nessas instancias (algumas semanas ao ano), assim as suas embarcações são normalmente utilizadas muito poucas vezes ao ano. Desta forma, o tráfego que se refere é algo pequeno, quase insignificante, podendo ser acrescentado pelo apoio que se presta a embarcações passantes e constituindo este um factor de risco, pode perfeitamente ser eliminado, sendo que embarcações passantes terão de buscar outras facilidades em Espargos, Santa Maria ou Pedra de Lume. Sobre a introdução de novas espécies em si, com o tráfego limitado diminui-se já essa ocorrência, mas de ressalvar que a Baia de Murdeira já não é “virgem”, ela é utilizada frequentemente por embarcações e pelos próprios pescadores que afirmam ter de navegar para zonas bastante longes e até outras ilhas e retornar a Baia. Assim também este impacto não parece ser de importância elevada, nem é um facto que se ocorrerá pela primeira vez. Aos demais acidentes (principalmente derrames ou utilização de líquidos não próprios) que possam acontecer dentro da Marina, por esta se situar numa bacia artificial, oferece desde já uma bacia de retenção, onde medidas imediatas podem ser tomadas antes de se atingir a Baia em si. Assim os riscos que se corre neste tipo de Marina são bastante inferiores aos riscos de acidentes de uma Marina convencional.
h) Ao diferentes cenários de implementação apresentados no EIA, e defendo estritamente o ponto de vista ambiental, deve ser escolhido aquele que menor impacto causa ao ambiente, independentemente da solução de investimento ser mais custosa. (por exemplo a solução 2).
i) O EIA devia prever ou propor um canal de navegação limitado, único e exclusivo para se circular na Baia (com regras que definem a velocidade, frequência, horários etc), isso diminuiria vários riscos, é matéria que deve ser estudada pelas autoridades. Mais ainda, espera-se o plano de gestão da área protegida da Baia de Murdeira, que irá ditar as formas e tipos de utilização dessa Reserva Natural. Por exemplo se ficar decidido que a Reserva Natural da Baia da Murdeira pode continuar a ser utilizado por exemplo para o mergulho desportivo, ou alguns desportos náuticos, essa utilização poderá por exemplo causar um impacto ambiental negativo bastante maior do que a Marina que se prevê. É precisamente na prática de vários desportos náuticos onde a conduta pode levar a vários acidentes com repercussão ambiental. Também são as ancoragens provocadas pelas pequenas embarcações de recreio que contribuem para destruição de fundos marinhos. Para além destes, sabe-se que a utilização de pequenos motores de dois tempos (fora de borda) no pequenos deporto náutico é nociva ao ambiente, visto que até 30% do combustível e óleo acabam por misturar-se com o ar e a agua, isto derivado da própria forma de combustão desses motores. Assim, se continuar a ser autorizado o desporto náutico na Baia da Murdeira, os impactos que uma marina “clean marina” causam nesse ambiente são insignificantes se comparados aos impactos já causados por uma certa utilização dessa Baia.
j) Aos serviços que a Marina poderá prestar, estes devem ser bem estudados e autorizados ao não, caso não garantirem absoluta segurança. (Fornecimento combustível, reciclagem de fluidos, esgoto e agua, lavagem, pequena reparação etc.)
Considerando todos estes pontos e mais os reflectidos no EIA, vê-se que a construção de uma marina na zona tampão da Reserva Natural da Baia da Murdeira causa de facto impactos significativos no ambiente marinho, as mais nocivas de carácter temporal (dragegens) e as restantes, com possibilidades de serem atenuadas com boa conduta e gestão, reduzindo-as a um nível mínimo, viabilizando as possibilidades de renovação e sustentabilidade da vida natural na Baia. Também se viu que o impacto causado por este empreendimento é apenas um impacto entre muitos outros que acontecem já e irão acontecer em maior escala na Baia da Murdeira, que se não seguirem a melhor conduta ambiental, poderão inviabilizar as características únicas dessa Baia. Assim, só farão sentido estas medidas se forem de facto impostos e seguidos por todos.
Obvio que um trabalho de seguimento contínuo deve existir conforme proposto no EIA, os promotores devem ser responsabilizados pela qualidade do ambiente nessa área, devem participar activamente na co-gestão dessa área e a eles devem ser cobrados as taxas necessárias que deverão reverter ao fundo do Ambiente, responsável pelas medidas de gestão e acompanhamento de todas as áreas protegidas.
etc, etc, etc....
César tudo isso no teu Blog…. e depois dizes não ter sorte!!!! Vais pagar umas cervejas, ai se vais…. (aproveita para ligar para o Moeda e ver se ele anda a checar teu blog. ajudaria de certeza. Ou manda-lhe aquele parecer que te enviei... abre alguns horizontes)
Aquele abraço e conta sempre comigo
Kiko"