27.7.10

Grito

A propósito do comentário de Houss no post "silêncio", sobre a ausência de Amílcar Cabral nas nossas notas (dinheiro) e sobre a sensação do desvanecimento da figura deste líder maior, do nosso dia-a-dia, das nossas conversas.

Eu tive a "obrigação" de ler muito sobre Cabral, para um trabalho que fiz e foi lendo que descobri o quanto nós somos ignorantes do seu percurso, importância para o pensamento nacionalista africano, influência para os nossos primeiros dirigentes e figura de destaque no mundo. Os suecos devem admirar Amílcar Cabral mais do que nós próprios. Parece-me que é mesmo da humanidade, não conseguir valorizar o que está perto demais, o que nos parece demasiado vulgar para ser elevado.

Bem, como isso não quero dizer que as figuras da história devam ser mitificadas. Não, mais simples que isso; temos unicamente que continuar o trabalho que eles começaram. Amílcar Cabral fez um grande esforço para a definição de uma série de condutas, para que os povos africanos pudessem se emancipar e trilhar o seu próprio caminho. É verdade que boa parte da sua moral está vinculada ao contexto da guerra, mas é verdade também que ele professava essencialmente a valorização do homem; por exemplo, acho de um romantismo insuperável, que ele tenha insistido em ter escolas para todos, em plena guerra. Ele era um idealista, mas ao mesmo tempo um pragmático.

A minha posição em relação a Cabral, não é de endeusificação; é de aprender a ter respeito pela história e a admirar um homem de obra. Uma inspiração, no fundo.

Nós aqui, não é só Amílcar Cabral que não valorizamos; estudamos muitos dos grandes filósofos, mas são poucos os que conseguem identificar as suas condutas ao que aprenderam na escola. Somos imediatistas, fingimos que os problemas são só dos outros, somos ligeiros e vaidosos. É de contar nos dedos os homens deste Cabo Verde da actualidade, que inspira uma real admiração.

22.7.10

Lata

Guiné Equatorial declara português como a terceira língua oficial do país (SAPO CV)

Isto equivale a Cabo Verde declarar o francês como língua oficial. Lidamos muito com o francês, principalmente ao nível da Adm.Pública, ou seja, muitos documentos e até concursos públicos vem em francês. Ora isso tem a ver com as relações internacionais, agora daí a declarar o francês como língua oficial em Cabo Verde seria um pouco forçado. Como é declarar o português a 3ª língua oficial da Guiné Equatorial. Eles falam espanhol, mas o que é que o rabo tem a ver com as calças?

Que ao ditador Teodoro Obiang tenha a pretensão de pertencer ao CPLP, como forma de branquear a sua política do terror, é uma coisa; outra completamente diferente é receber os apoios internacionais, nomeadamente de Cabo Verde. Muitas serão as argumentações a favor da Guiné Equatorial: é um país católico, tem ligações de história com portugal por pelo menos 1 século, tem um elevado PIB per capita e um IDH (Índice Desenvolvimento Humano) maior até que Cabo Verde, embora esse índice está a ser grandemente puxado pelo PIB, já que os indicadores sociais (ensino e sáude) são inferiores aos nossos, importantes organizações internacionais estão presentes no país, tem o apadrinhamento dos USA e da Espanha e, para todos os efeitos, há eleições no país, embora sejam altamente contestadas, pela oposição e por observadores internacionais.

Tenha os indicadores que tiveram, um país governado por uma única pessoa há mais de 30 anos, que tomou o poder por força militar, que manda executar os seus opositores, que nomeia pessoalmente o primeiro-ministro e todos os governadores de província (o país tem 7 províncias), que nomeia agentes da Justiça e que ganha as eleições com 98% dos votos (impossível em qualquer Estado decente), não pode ser considerado um Estado sério, pelo Comunidade Internacional. Mas ao que parece, o dinheiro está cantar nos ouvidos dos dirigentes dos nossos país e encadeando os seus olhos, até que perdem o discernimento das suas acções.

Para o Presidente do meu país, herói de luta contra o colonialismo e fascismo português, combativo negociador da Independência Nacional, é inaceitável o apoio a um ditador. Desilude-me.

Fontes: 

21.7.10

Som

Aconteceu no Palácio da Cultura, ontem, dia 20, uma jam session entre músicos das Canárias (bons) e músicos de Cabo Verde (bons) e do encontro resultou um repertório…brasileiro! Ponham dois músicos de partes diferentes do mundo, em comum vão conhecer um sambinha, quase de certeza. É como dizer que, a música popular brasileira é uma língua franca musical. Na verdade a música brasileira é uma grande escola.

Para além de que, tradicionalmente, o Brasil tem muitos ritmos e géneros, resultante da grande mistura de povos que resultou o seu povo, o factor mais importante para terem a sua música bem desenvolvida e divulgada pelo mundo, é que tem muita qualidade técnica e isso só se consegue com escola. Escola, escola, escola. Tem de ser esse o nosso lema na actualidade.

19.7.10

Rafael Sica

Silêncio

"O silêncio, por definição, é o que não se ouve. O silêncio escuta, examina, observa, pesa e analisa. O silêncio é fecundo. O silêncio é a terra negra e fértil, o húmus do ser, a melodia calada sob a luz solar. Caem sobre ele as palavras. Todas as palavras. As palavras boas e más. O trigo e o joio. Mas só o trigo dá pão."
José Saramago, in Deste Mundo e do Outro, Ed. Caminho, 7.ª ed., p.56

Alma

Sou desabridamente fã de David Lynch, o cineasta dois tempos à frente do seu tempo. O cinema de Lynch não se vê, estuda-se. Não há uma única pessoa no mundo, nem mesmo o mais experimentado crítico de cinema, que pode gabar-se de ver um dos seus filmes de um só sorvo. É preciso rever, discutir, analisar, teorizar e comparar teorias, sempre numa tentativa de adivinha, que o próprio Lynch nunca facilita; nunca entrega as chaves, talvez, como o próprio diz, não tenha chave nenhuma. Um dos filmes que mais me marcou foi Mulholland Drive e esta (http://obviousmag.org/archives/2007/12/david_lynch_clu.html) é só mais uma das dezenas de adivinhações que já li sobre o mesmo...Acaba por ajudar de alguma forma.

18.7.10

Éter

Até nunca deixaria que isto que está prestes a acontecer, acontecesse, caso fosse pago para estar aqui a aturar o mau fígado de cada qual, os humores fétidos de uns e outros, a acidez de estômago de tantos que passaram por aqui. Não sou pago. Isto é mantido por esforço e vontade próprios. Já aturei uns tantos parvos, mas hoje, num Domingo, dia de família, paz, amor fraternidade, dia de sol e praia e almoços divertidos, um parvalhão conseguiu mudar-me. Venceram as forças do mal.


As intenções deste blog foram as melhores. Quis ter uma plataforma de diálogo. Quis ajudar a criar um espaço de encontro supranacional, sem fronteiras e restrições localistas. Acreditem se quiserem, mas também se não acreditarem, pouco me importo, nem vou sabê-lo, porque nem poderão dizê-lo mais aqui.

A partir de agora, este espaço é meu e de mais ninguém. Mando as bocas que quiser e bem entender e, desculpem qualquer coisa, não poderão replicar. A partir de agora este espaço não publica anúncios de espectáculos ou exposições, portanto não mo peçam. Acabaram os projectos colectivos, blogjoints e coisas do género. Pouco me importa se o país desliza na sua própria defecação ou se cheira a rosas. O que anda lá fora exige ser encarado de cara feia e palavras igualmente rudes.

Um apreço às centenas de pessoas que adicionei à minha lista pessoal, aquele abraço, continuem vindo que isto continua por cá e se quiserem comentar, os que são amigos, terão oportunidades de o fazer. Aos da má fé, vão lá se matar lá prós quintos do inferno, que aqui é lugar de gente saudável.

16.7.10

Tinta

É a minha estréia (em grande) em design de capa de livro. A fotografia é de Duarte Belo, um fotógrafo poeta. O livro é de, nada mais, nada menos, que o nosso mais premiado escritor, José Luiz Tavares.

Acreditem que o livro é bem mais bonito que esta simples imagem; tem a capa, a contra-capa, as badanas, a lombada e o miolo, que é um papel que parece reciclado; o desenho de uma capa se faz por pequenos detalhes, que agora, ao pegar no livro, corre-me uma alegria de ter feito boas escolhas, de proporções e posicionamentos. Ocorreu-me que os nossos escritores, se conta pelos dedos de uma só mão, os que cuidam do aspecto gráfico dos seus livros; é só ver para a parte da livraria que diz: "literatura cabo-verdiana".

E já agora, quem ainda não leu José Luiz Tavares, que tente fazê-lo. Vá, é poesia, é uma linguagem muito elaborada, com toques de literatura clássica, o vocabulário, muito dele, já não está em uso, e são temáticas também elas profundas, não evidentes ao primeiro olhar. Acontece com toda a expressão artística; há aqueles que produzem para consumo imediato; há aqueles que produzem para rasgar os limites da nossa compreensão; José Luiz Tavares é da segunda categoria.

15.7.10

Adesão de Cabo Verde ao FODETE está mais ou menos assente

...estamos fod***s

Copy&Paste

"Aquele cheiro era igual ao do meu avô. Cheiro de blazer de fazenda antiga misturado com cigarros, um cheiro amarelado, macerado, das pontas dos dedos.

É um cheiro que quase não o chega a ser. É o cheiro da total ausência de uma gota de perfume, de um aroma, ausência de qualquer nuance contemporânea naquele corpo estranhamente tão jovem.

Deixei-me senti-lo, inspirei-o com a memória. E a sorrir daquele sorriso encabulado como quem coça a cabeça, meti a mudança e lentamente carreguei no acelerador."

(És uma inspiração, Minhokinha. Sorte a ti e aos teus)

14.7.10

Ar

Todas as mudanças são necessárias, até mesmo as detestáveis mudanças de casa. Mudanças mexem as coisas, põe-nos a mexer. Revemos coisas antigas, tiramos o pó dos cantos, refrescamos a pintura, deitamos coisas no lixo, eventualmente compramos coisas novas. Mudanças são necessárias em tudo: em casa, no blog, na política, na profissão.

No nosso país precisamos de muitas mudanças. A política precisa mudar; o ideal seria substituir toda a classe política, governo e oposição, por coisa nova, embora saiba que a coisa nova se tornaria na mesmice. Mudança é preciso no discurso político. Aliás, é preciso no discurso em geral. É preciso mudar de estilo, de gostos e tendências. Precisamos largar o provincianismo de ideias e abraças este admirável mundo novo. Andamos em passo atrás, no plano das ideias e isso é atroz.

Mudar, mudar, mudar. Perder o medo de perder-se. Quem não muda, não se dá a oportunidade de descobrir; descobrir-se.

9.7.10

Água

Sexta. Vou institui-lo nas minhas efemérides pessoais, como o dia da amizade. É o dia de ver os amigos, após uma semana de trabalho.

Hoje, há exposição na iGallery sobre o Eugénio Tavares. Visitar uma expo é sempre um óptimo programa, principalmente quando o lugar é de bom gosto e os promotores sabem o que fazem. Reforço o convite para a minha própria exposição, UTOPIA, a decorrer no Palácio da Cultura, até ao dia 12, sempre das 19h30 às 22h. Hoje ainda há debate com Nardi Sousa e Abel Djassi, a partir da minha exposição, a começar às 20h.

Também hoje, vai haver mais um festival de música. Aliás a minha sugestão à cidade, é que começasse a pensar num grande espaço público para concertos. O Taiti serviria perfeitamente e seria uma óptima alternativa ao monstro de betão que pretendem lá por.

Digam o que disseram, a cidade da Praia é o verdadeiro centro do cosmopolitismo CV da actualidade. Simplesmente é aqui a ponta da vida económica, social e cultural do país. Não que torce por isso; é um facto.

8.7.10

Pau

Esse miúdo anda por aí, nos becos, praças, mercados ou a parte que calhar da cidade. Os seus cerca de 14 anos, se não for isso, não será mais que 15, foram já totalmente adulterados pelo álcool e sabe-se lá que mais outras drogas. Do álcool é evidente porque lhe sai pelas ventas, pela boca, pelo nariz, se calhar pelos ouvidos, pelos poros da pele e pelos olhos inchados, um vapor fétido a álcool da pior fermentação. Esse miúdo é um alcoólatra juvenil. E é bandido. Faz medo ao mais gigantesco homem, porque os seus olhos são de diabo, como que pudessem mandar qualquer um para os quintos do inferno com um só desejo da mente e olhar. Tresanda a álcool, a falta de anos de banho, ao chão onde deve dormir, aos becos onde deve mijar e cagar, a miséria! E no entanto não passa de um miúdo de 14 anos, como eu fui, com a pequena diferença que não dever ter sido criança desde que nasceu.

Era esse miúdo que estava a ser espancado sem piedade por uma vendedeira, dessas que pesam toneladas e dão muros que dói só de ver. Espancava o miúdo carregada de uma raiva, que ultrapassava qualquer valor que o miúdo tivesse tentado roubar ou qualquer coisa que tivesse feito. Era uma raiva talvez com séculos, que se descarregou naquele momento em cima de uma criança. Seja ela um bandido, um produto colateral da sociedade, um lixo humano, mas uma criança. E veio a polícia, a tratá-lo pelo nome, talvez fartos de o prender pela enésima vez. E vieram logo descarregando os cassetetes enormes para cima das costas do miúdo, das pernas, dos braços, completamente indiferentes aos gritos lancinantes da pobre criança. E enfiaram-lhe num carro, transformado em jaula metálica, e levaram-no.

Deu-me vontade de mandar à merda as centenas de pessoas que assistiam à cena, com aplausos adicionais e palavras de perfeito ódio, mas não o fiz por humana covardia. Por saber que as minhas palavras não o vão safar das mais porradas que há-de apanhar, da polícia, das pessoas e da porca vida.

7.7.10

A seguir na UTOPIA 2010


Um abraço aos que me visitaram na abertura da exposição. Obrigado aos que se deram ao trabalho de analisar o que viram e depois comentar, superiormente. Estão convidados os que ainda não foram, a tomar parte da expo e da actividades que vamos desenvolver:

07.jul - 19h
Visita guidada pelo autor seguida de Tertúlia sobre Identidade e Auto-Conhecimento do Núcleo de Estudantes de Psicologia da Universidade Jean Piaget.

08.jul - 19h
Visita guiada pelo autor seguida de Tertúlia com Edson Medina e Milton Paiva sobre a(s) leitura(s) da exposição.

09.jul - 19h
Visita guiada pelo autor seguidas de Tertúlia sobre a Liberdade com Abel Djassi (Politólogo, Boston University-USA), Nardi Santos (Sociólogo, Universidade de Santiago) e convidados

11.jul - 19h
Visita guiada pelo autor seguida de festa de encerramento da 2ª edição de UTOPIA

Visitem o blog do projecto: http://utopia-the-movie.blogspot.com/

A tal marca


Deixei correr tinta e bytes antes de me pronunciar sobre a marca Cabo Verde, criada por Rafael Fernandes, DiBooks para os chegados.

Não é o logo mais bonito que já vi na vida. Prefiro muito mais os logos das ilhas individuais, pelo mesmo autor, que faz parte do mesmo pacote. Mas convenhamos que o trabalho é astronomicamente superior a quase todos os logotipos, de todo o Cabo Verde, juntados. Se eu tivesse tempo, faria aqui uma colecção de logotipos pavorosos, das nossas instituições, das mais modestas às maiores. Gostando ou não, esteticamente falando, o facto aqui é que tecnicamente o trabalho é bem feito, como faz questão de demonstrar o autor aqui (http://logomarca-cv.blogspot.com/), com uma frontalidade que também contribuiu definitivamente para me "ganhar".

Mas também, a minha posição a favor deste logo, é uma posição CONTRA as posições intrigueiras, não objectivas, mal-dizentes e mais outras formas cabo-verdianamente vis de, mais atacar o outro, que se posicionar contra.

Suponho também não ser contraditório suportar a crítica de Emílio Rodrigues, porque também ela sustentada, firme e coerente, salvo o exagero da petição. Concordo plenamente que há questões que merecem mais debate, um processo mais elaborado, um concurso mais divulgado e um júri decente. De todo o modo, houve concurso e que eu saiba com tempo suficiente para que todos pudessem enviar as suas propostas.

Em resumo, gostemos ou não, tenha o processo decorrido da melhor forma ou não, o que não podemos fazer é, de forma ligeira, falar do trabalho de um profissional da forma como está sendo feita. Eu apoio esta marca, em apoio aos que trabalham, dão a cara e não tem nada para esconder. Costumo dizer, porque também assim me ensinaram: não é errado conseguir pouco; errado é não tentar nada...e ainda maldizer.

2.7.10

UTÓPICOS

Apresentando....

UTOPIA

dedicado a Cristina, pela paciência, e a Naia, um universo dentro de mim.

Com a especial ajuda de sistas e brothas: Samira Pereira, João Paradela, Nuno di Raiz, NDu e Lúcia Cardoso, my dear cousin. Especial apreço pelos extraordinários artistas Nuno, Ndu e Lúcia.

Feito graças à participação de: Milene e Dudu como guias do mundo do hip-hop da Praia. Agradecimentos à Associação Movimento Hip-Hop e aos grupos: B.Boss, Black Side, Central Side, Karaka, Kingston, Nito.G, Nunous, Shade.B, Va.Boss.

Um apreço à Fundação Amílcar Cabral que me acolheu e abriu as portas. Obrigado Leonor pela dedicação de formiga.

Por último, mas não menos, agradecimentos aos amigos e pessoas desconhecidas, que se dirigiram a mim e deram-me uma única mas fortificante palavra de apoio.