29.5.14

A Província

Artista: Jiri Kovanda

No lançamento de um livro (As Revoltas) que fala abundantemente e até repetidamente, de como o estado colonial, constituído por reis, raínhas, príncipes, governadores e demais hierarquias por aí abaixo, junto com a igreja e o seu longo historial de suporte ao poder, oprimia o povo, de forma física, concreta, abusiva, mas também de forma moral, ao propagar uma simbologia de superioridade branca-cristã, em detrimento dos negros e as suas "negradas", é curioso observar como o evento em si se faça num ambiente de pompa palaciana. Com direito a um atraso palaciano também, no que já se repete entre nós, enquanto não chega a comitiva real, nada começa. O tempo e a paciência dos súbditos que se lixe. A divisão do espaço e dos assentos, entre os muito ilustres, os mais ou menos ilustres e, na parte mais recuada, a comunidade dos alunos, também recria esse ambiente de reis, raínhas, demais titulares da corte e finalmente o povo, lá ao fundo. Tudo era muito protocolar. A miúda que nos recebia à porta tratou de me encaminhar para o meu devido lugar, unicamente com base na minha aparência, creio. Num misto de enorme atraso, desorganização e um excesso de aclamações, acabei por sair, por imperativo de outros compromissos, sem cumprir o meu singelo objectivo: ouvir os apresentadores e o próprio autor. Repete-se, recria-se uma visão da sociedade e das coisas, em que importa mais o aparato que a substância. Ao invés de se concentrar no significado profundo que é a publicação de tal obra, tudo se torna fogo-de-vista. Assim segue a província.

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