21.2.14

PFLNO (Países Falantes de Língua Não Oficial)


Andamos há séculos a falar numa língua ilegal. Este povo, está provado, é do mais subversivo que há. Primeiro resolveram ser povo, ato de ousadia extrema. E como povo, claro, tinham de ter língua. Mesmo perante todas as medidas das autoridades coloniais no sentido de proibir a nascente língua e, perigosamente, provavelmente, a nascente nação, este povo persistiu, falando descaradamente a sua língua, em todos os cantos, mesmo nos locais proibidos, como nas escolas, na igreja, ou nos tribunais. Este povo, agora independente, devia estar na cadeia por perpetuar essa insubordinação linguística. Cortejam-se na sua língua, namoram na sua língua, dão à luz na sua língua e, ato máximo de insubordinação, falam com os filhos na sua língua, em vez de cumprirem com a língua decretada. Ou seja, desde cedo ensinam-nos a ser rebeldes. Não conheço resistência mais bem preparada que essa. Portanto, não somos contra a oficialização da nossa língua. Somos é a favor da sua não oficialização, como condição de continuarmos a ser resistentes, malcriados e subversivos, falando teimosamente a nossa língua, agora até nos parlamentos, nas campanhas e se descuidarem até daremos aulas na nossa língua. Desde já, com a oficialização da nossa língua este blog perderia a maior parte do seu leit motiv. 


10.2.14

E se o japonês representasse assim o caboverdiano?

Foto: sapo.cv

Do fórum Geração da Independência, com a sua tímida abordagem à África, à Semana da República, com a sua dissonante palestra sobre lideranças políticas em África, à Cimeira Africana da Inovação, com o seu tom afro-entusiasta, ao desfile dos auto-proclamados "Mandingas do Mindelo", ressalta-me uma vez mais que o nosso(?) continente continua a ser alvo de todos os maus-tratos, ora por ignorância pura, ora por  pseudo-intelectualismo, ora por excesso de exaltação, ou então por desrespeito direto.

Em relação aos "Mandingas do Mindelo" se por um lado reconheço que carregam um protesto, por outro revelam uma representação, no mínimo ridícula, do povo Mandinga, em que cerca de 11 milhões de seres humanos se identificam (wikipedia). Esses "Mandingas do Mindelo", recordo-me bem desde criança, sempre simbolizaram a sociedade maldita, a que vem lá das "fraldas", sujos, perigosos e feios. Eram assim vistos, nas nossas cabecinhas. Ressurigiram agora, num misto de moda e reclamação do direito à tradição, com um certo apoio, não sei se alargado ou não, da sociedade que os acolhe. Claramente continuam a representar um certo protesto, como atesta as palavras de um deles, em entrevista, dizendo: "vocês já tiveram a vossa diversão, agora queremos ter a nossa". Esse "nós e vocês" não deixa de ser sintomático dentro de uma mesma sociedade. Mas esse "nós e eles" também é bastante sintomático na forma como se representam. Pintam-se de negro e qual é o significado de um africano se pintar de negro? Ou serão não-africanos a representarem africanos? Enfeitam-se de vestes, acessórios e objetos, da mesma forma que um cinema e um teatro antigamente ridicularizavam os negros e os povos "primitivos". Têm uma dança própria, carburada de álcool, sexo-exibicionista e poses guerreiras. Qual o significado disto tudo?

Para além de todas as considerações, em relação aos produtos altamente tóxicos com que se revestem, do alcoolismo e do excesso de linguagem, uma consideração mais básica não devia ser feita em relação ao próprio nome que carregam? Já perguntaram aos guineenses, senegaleses e malianos, que porventura sejam Mandingas, o que pensam desse carnaval? Ah bom, mas é a tradição. Pois, tradição também é mutilar o sexo de jovens moças.