Em que situações o árbitro anula o jogo? Pelas razões que me ocorre, se uma das equipas não comparecer, chove aos potes que os jogares nem conseguem se manter em pé, em situação de falta evidente de segurança, se o campo racha ao meio, ou seja, em situações obviamente de anulação. Não consigo encontrar uma razão satisfatória para o Ministro da Saúde ter anulado o concurso de avaliação curricular à classe médica.
História. Os médicos não são promovidos desde 95 por falta de concurso, para determinar de forma criteriosa, quem deve e quem não deve ser promovido. Finalmente se faz, e pelo próprio Ministério. Até aqui bravo. Resultado do concurso: a esmagadora maioria dos médicos obtêm classificação de aluno suf- a medíocre. E este é só um concurso curricular, ou seja, a malta só tinha que inventariar a papelada, as formações, os workshops, os papers científicos que tenham produzido, o currículo profissional e por aí fora. Imaginem se fosse uma avaliação de desempenho? Se um dos critérios fosse "satisfação do utente", aí é que muita gente ia apanhar com um "mau". Se a malta da "bata branca", como são conhecidos, não passaram neste concurso, ou é porque não apresentaram a papelada, ou é porque não a têm, literalmente. Face a isso, claro está, senhores do mundo (ou da vida, mais propriamente) como são os médicos, contestaram (os maus) em massa e o Ministro da Saúde, numa saída que não lembrava o diabo, ANULA o concurso, satisfazendo os maus e prejudicando os bons. Ainda por cima diz o seguinte: "a breve trecho, e em concertação com as entidades pertinentes, decidir-se-á da conduta a seguir". (A Nação, 5/8/2010)
Não é aceitável sob nenhum ponto de vista a decisão do Ministro. Se o concurso continha irregularidades, como alegam os "prejudicados", que não se fizesse. Se os critérios não eram claros à partida, que a classe não os aceitasse, impugnando o concurso antes que acontecesse. O que não podia acontecer era, que se anulasse um concurso, conduzido por gente séria, inclusive com a participação da própria Ordem dos Médicos, com base em descontentamento dos que (mesmo sendo a maioria) o concurso não tenha corrido à feição. É com essas atitudes que os políticos desvirtuam gravemente o jogo do Estado de Direito. Como é que os cidadãos podem confiar nas autoridades, se não sabem ao certo por que batuta se rege o próprio Estado? Que poder é esse, supremo, de um dirigente político anular um acto administrativo (e logo legal), com base em critérios tão subjectivos, ou no mínimo mal explicados? Poder pode, senão não o teria feito, mas será que deve? A conduta a seguir é caso a caso?
Mais uma grave desilusão na forma como se conduz os assuntos de Estado. Por razões de coerência, ou fazemos concursos correctamente e os respeitámos, doa a quem doer, ou não fazemos concurso nenhum e assim sabemos que isso funciona ao gosto do freguês.