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27.4.10

Democracia elementar

Baltazar Garzón é um juiz espanhol que fez coisas impensáveis: deu ordem de prisão ao Bin Laden (que não compareceu, se calhar porque tinha uma indisposição, como uma determinada figura local), acabou com a carreira do ex-chefe de governo espanhol, Felipe González, ao denunciar um caso pouco abonatório, mandou extraditar Pinochet de Inglaterra para Espanha (que também não cumpriu porque tinha cãibra nos pés), julgou criminosos da II Guerra Mundial, pôs o diabo de quatro, só que, embalado pelo sucesso, foi mexer com gente poderosa dentro de casa. As elites, que tem mais força que o próprio Estado, arranjaram forma de agora ser ele a sentar no banco dos réus. Lá vão eles acabar com o defensor da justiça.

Fez-me lembrar o caso da apanha criminosa (do ponto de vista ambiental) de areia na ilha do Sal para a construção civil, por parte de empresas privadas, ao qual um brilhante e jovem juiz interpôs-se. Lembram-se? A coisa deu que falar. Aliás o dito juiz deu que falar por essa e outras, até que lhe arranjaram um lugarzinho na Assomada, onde faz sempre um ar fresco, a ver se o jovem esfria os ânimos. Bonito. O caso vai ser encerrado, por não cumprir com algum pormenor legal, as empresas supostamente infractoras foram todas absolvidas e já não vão ter que pagar a astronómica multa que seriam condenadas a pagar e não me espantaria se agora fosse o Estado a indemnizar as empresas em questão, por prejuízos materiais e morais.

Lição da história: mexam em tudo, menos no meu queijo (para quem conhece a parábola "Quem mexeu no meu queijo?").

22.4.10

Quinta,Essência


"Cabo Verde é o país mais europeu de África"
Alberto Navarro (SAPO CV)

Este tipo de afirmação e outras, como a do Dr.Mário Soares que valia mais a Cabo Verde ter-se mantido nação portuguesa, estão na lógica das frases que Salazar proferia para convencer o mundo que na "Guiné Portuguesa" havia paz social, que "Angola é nossa", que Cabo Verde é Portugal, etc. Foram essas afirmações que os Nacionalistas contrariaram para poder ganhar a guerra da Independência. Mas o que me incomoda mais que essas afirmações fáceis e gratuitas, são os dirigentes e intelectuais caboverdeanos que no momento em que os seus pares europeus dizem essas coisas, ficam caladinhos. O meu medo é acreditem mesmo nessas afirmações ou, pior, que não tenham argumentos para rebater.

Agora pergunto, qual é o sentido da frase acima? Se é por causa da língua, não senhores, a nossa língua não se parece com o português; se é por causa da música, não senhores, a nossa música não se parece com a europeia; se é por causa da vida social, sim, é parecida; se é por causa da paz e da democracia....espera, isso não é uma invenção europeia; isso da paz e da democracia, ou a falta delas no nosso continente, não tem a ver com Europa (a civilização, subentende-se), mas sim tem a ver com processos históricos, governos africanos corruptos e governos ocidentais hipócritas, que ao mesmo tempo que reclamam por democracia, vendem armas.

A frase pode ser engraçada, como dizer que Lisboa é uma cidade muito africana. Só que para o nosso caso, onde o debate da identidade está carregada de contradições, essas frases parecem-me completamente evitáveis.

19.4.10

Nomenklatura

Ser político e não pertencer a partido nenhum, pode sim senhor!

Após a leitura do colosso de José Vicente Lopes, "Nos bastidores da Independência", penso ter percebido um pouco mais da nossa história política recente. Sempre ouvi falar de maoistas e trotskistas, achando piada aos nomes, que parecem saídos de algum filme de propaganda. Agora percebo melhor a questão, estando mesmo assim longe de a descascar. Isso será matéria para estudiosos da política, daqui a alguns anos, com mais distância dos factos.

No entanto a minha leitura é que, os que eram chamados de "trotskistas" representariam uma elite, de homens fortemente politizados, mas com outras vertentes de formação pessoal, com valias culturais fortes, apreciadores da literatura, do cinema, da música erudita, bem falantes, bem articulados, que terão "complexado" a malta que vinha do mato, que tinha uma práxis política muito mais directa e pragmática. Trotskistas podem ser considerados utópicos, enquanto que os radicais do partido podem ser considerados realpolitik. Os trotskistas acabam por sair do partido (PAIGC), por incompatibilidade. Aparecem mais tarde nas fileiras do MPD, mas logo se incompatibiliam com a linha centralizadora de Carlos Veiga, a lembrar a velha nomenklatura e, mais uma vez, saem, ou são corridos, ou como preferirem.

Grande coincidência ou não, os trotskistas são grandes homens deste país, com partido ou sem partido. São homens admiráveis em si, pela sua Cultura e o seu percurso intelectual. Por mim deveriam continuar a ter uma intervenção altamente política, mas que evitem os partidos. Parece estar demonstrado que, em termos de associativismo, espírito de cidadania, trabalho de grupo, visão de conjunto e capacidade de projecção, ainda estamos longe. Os partidos são só uma parte bem visível deste nosso carácter anti-democrático.