3.4.09

Cultura de Supermercado

Quando desapareceram os botecos e as tascas é que damos conta de como eram essenciais aos encontros mais pessoais, às tocatinas e às estórias da paródia. Na mesma medida, desapareceram as lojas de discos, as livrarias, as lojas de artesanato, as adegas e todo o tipo de comércio especializado. Na europa já se faz um movimento contrário aos supermercados e ao estilo de vida fast. Já se fala em "slow-food" e em "slow-down". Aqui, agora começamos a adorar esta Cultura do Supermercado.

Ao falar de Música de Supermercado, referia-me precisamente a esta maneira de fazer música em que, como dizem os meus comentadores em "Eclipsada", desaparece a alma dos artistas. Junta-se uns tantos talentos, faz-se um alinhamento de temas de sucesso garantido, encomenda-se uns sopros de Cuba, uns violinos de França, umas guitarras de Portugal, uns batuques de Cabo Verde, embala-se bonitinho e pronto, temos produto. E é assim que a música se descola da vida social, enquanto reprodutor desta vida, para passar a ser um produto de entretenimento. E na maior parte das vezes com qualidade razoável. São produtos fáceis de se consumir e não pensar muito. É cómodo.

Já não temos paciência para escolher um vinho, atentando bem nas castas de que é feita, do ano que é feito, do terreno que produziu as uvas e para o tipo de comida a que o vamos combinar. É fácil escolher o vinho do supermercado, que todos dizem que é bom. Rejeitamos Danae, porque é desalinhada, nos manda à merda, é suja, sofre com a vida, tem angústias como todos nós e a decarrega sonoramente, com muita classe. É fácil ouvir essa música que nos entra pelo ouvidos e nos embala. É uma questão de escolha. Eu não quero Cultura Fácil.

3 comentários:

JB disse...

Mesmo a propósito publico hoje no Café Margoso um texto (que não é meu) sobre este mesmo assunto. Vão ler, vale a pena. Abraço.

Anonymous disse...

Posso e não posso concordar contigo a cem porcento, pq a universalidade da música esta mesmo rendida a música cAboverdeana.

A nossa pura música esta em "risco" por ex: quando Tcheka esteve cá pela 1ªvez na Fabrica da Polvora com o seu 1ªalbum fiquei rendido e o som não saiu da minha memória até que lancou o 2ºCD com produção e influência do Lenine e fui ve-lo a S.Jorge cá em Lisboa fiquei super frustrado, pq já não vi aquele miúda ingenue a cantar e tocando aquelas sonoridades do Pantera, de Santiago, de Cabo Verde.

Saudações Culturais!

Cesar Schofield Cardoso disse...

Caro visitante, permita-me discordar a 100% contigo. A nossa música "pura" está longe de estar em risco. Para começar, sabes, essa noção do "puro" em artes há muito que se lhe diga. As artes tem que avançar, misturando-se com outras influências. O que temos que fazer é construir a memória, para podermos nos situar na história. Já imaginaste se o jazz americano ficasse pelo swing? Não amigo, a nossa música tradicional está bem marcada dentro de nós, já está razoavelmente bem memorizada, embora não haja um trabalho aprofundado de escrita, mas pelo menos já há alguns bons discos de preservação da memória: por exemplo, a Cesária Évora tem um disco lindíssimo chamado "Rádio Mindelo"; Bau e Voginha tb fizeram um disco "Relembrando os mestres".

Amigo, qualquer artista da actualidade, a ser produzido por Lenine é uma honra. Tens de pensar que o Tcheka aprendeu muito com o projecto. O Lenine é um mestre em misturar as suas raízes, rock, jazz e outras influências. O resultado é que ele tem uma música que não é nenhuma das originais; é uma coisa NOVA. Ontem vi o Tcheka no KrioJazz e cada vez mais tenho a certeza que ele ainda tem muita capacidade de crescer.

Saudações