8.7.10

Pau

Esse miúdo anda por aí, nos becos, praças, mercados ou a parte que calhar da cidade. Os seus cerca de 14 anos, se não for isso, não será mais que 15, foram já totalmente adulterados pelo álcool e sabe-se lá que mais outras drogas. Do álcool é evidente porque lhe sai pelas ventas, pela boca, pelo nariz, se calhar pelos ouvidos, pelos poros da pele e pelos olhos inchados, um vapor fétido a álcool da pior fermentação. Esse miúdo é um alcoólatra juvenil. E é bandido. Faz medo ao mais gigantesco homem, porque os seus olhos são de diabo, como que pudessem mandar qualquer um para os quintos do inferno com um só desejo da mente e olhar. Tresanda a álcool, a falta de anos de banho, ao chão onde deve dormir, aos becos onde deve mijar e cagar, a miséria! E no entanto não passa de um miúdo de 14 anos, como eu fui, com a pequena diferença que não dever ter sido criança desde que nasceu.

Era esse miúdo que estava a ser espancado sem piedade por uma vendedeira, dessas que pesam toneladas e dão muros que dói só de ver. Espancava o miúdo carregada de uma raiva, que ultrapassava qualquer valor que o miúdo tivesse tentado roubar ou qualquer coisa que tivesse feito. Era uma raiva talvez com séculos, que se descarregou naquele momento em cima de uma criança. Seja ela um bandido, um produto colateral da sociedade, um lixo humano, mas uma criança. E veio a polícia, a tratá-lo pelo nome, talvez fartos de o prender pela enésima vez. E vieram logo descarregando os cassetetes enormes para cima das costas do miúdo, das pernas, dos braços, completamente indiferentes aos gritos lancinantes da pobre criança. E enfiaram-lhe num carro, transformado em jaula metálica, e levaram-no.

Deu-me vontade de mandar à merda as centenas de pessoas que assistiam à cena, com aplausos adicionais e palavras de perfeito ódio, mas não o fiz por humana covardia. Por saber que as minhas palavras não o vão safar das mais porradas que há-de apanhar, da polícia, das pessoas e da porca vida.

1 comentário:

da caps disse...

Ou se calhar também por ele representar parte de uma geração, que faz muito pior que roubar nos mercados, e sem que tenham se calhar também tanta miserabilidade.
Se calhar mostrar simplesmente que o polícia está aí e não tem (nem deve) mão leve com a criminalidade juvenil, que em termos de crime, tem proporções avessas à idade dos que o praticam.

A seguir, aí sim, na cadeia ou depois disoo, devem entrar outras entidades, esses que de solidariedade social e direitos humanos, para evitar ou minizar a probabilidade de o mesmo volte acontecer com o "miudo"..