Foto: Arquivo Histórico Nacional
Ainda notas da Semana da República, agradecendo todo o manancial de informação produzido por esses dias. Promovida pela Presidência da República, tivemos o privilégio de assistir a uma mesa-redonda sobre o legado das lideranças africanas no pós-independências. Quanto a África, heis os meus pensamentos:
É constrangedor a esquizofrenia identitária que continuamos a ter em relação ao continente. Como disse o antropólogo Carlos Anjos, de onde vem essa ideia de uma excepcionalidade cabo-verdiana? Europeus não somos de certeza. Americanos nem tanto. Asiáticos muito menos. Então somos o quê? Atlântidos? Um povo especial?...Já que resistimos à denominação de, simplesmente, africanos.
É bom lembrar que os ideias de nacionalidade, independência e auto-determinação, se afirmaram num quadro de africanidade, ou seja, num momento de identificação clara de civilizações africanas distintas das europeias. Mesmo se devemos tributar ao longínquo Du Bois e outros ativistas negros, as primeiras reivindicações descolonizadoras, é a geração de Cabral e outros eminentes africanos, como NKrumah, Sénghor e outros, que deu o corte radical aos colonizadores. A nossa luta pela independência se fez num quadro de solidariedade africana, tendo Argélia como enorme suporte financeiro, militar, logístico, Guiné Conakry como base militar, ou a própria Guiné-Bissau como palco de guerra aberta. Agora, passados os anos, questionamentos o nosso pertencimento africano??
Sejamos amnésicos, ou mesmo ingratos, mas e a atualidade? Até quando vamos continuar a fingir que uma boa parte da nossa população hoje não é constituída de africanos purinhos, eles sim, sem dúvida nenhuma se são africanos ou não, ou seja os imigrantes? E os seus filhos e netos quando forem cabo-verdianos de direito pleno, também sofrerão dessa dúvida identitária? E o Islão, que é uma realidade no nosso solo? Islamofobia? E todos os fenómenos que passam pelas nossas águas, inclusive o tráfico humano? Um problema "deles"? E as trocas imensas, comerciais e culturais entre nós e "eles", não tem significado?
É mesmo constrangedor esse debate vacilante sobre o nosso continente. Pelo menos o meu continente.
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